terça-feira, 27 de outubro de 2009

1335) Quebrando a moldura (23.6.2007)



Folheando álbuns de fotografias antigas e atuais a gente percebe duas coisas. Uma é que os formatos das molduras, dos “frames”, muda muito com o passar do tempo. O quadrilátero que define o espaço fotográfico não tem feito outra coisa senão mudar ao longo do tempo, por motivos técnicos ou estéticos. Em geral, uma foto consiste num retângulo; não são freqüentes as fotos em formato de um quadrado perfeito. O quadrado perfeito é estático, pode ser girado de um lado para o outro que não se altera. E é centralizado demais. Serve, por exemplo, para retratos, rostos, mas não se adapta bem ao registro de paisagens e ambientes. Este se dá melhor no formato retangular, chegando até a experiências mais recentes como a famosa imagem panorâmica, que consiste num retângulo com proporções mais ou menos de 1:8 ou até mais.

A segunda coisa que a gente percebe é que o formato preferencial da foto, como o do cinema, é um retângulo deitado. Por que? Porque corresponde intuitivamente ao nosso campo visual, que tem mais ou menos esta forma pelo fato de nossos olhos estarem colocados lado a lado (correspondendo aos hemisférios cerebrais). Se nossos olhos estivessem colocados um acima do outro, as telas de Cinemascope no mundo inteiro seriam verticais, em vez de horizontais.

No princípio da fotografia chegou-se a cultivar a foto em forma de círculo, mas ao que eu saiba ela foi rapidamente esquecida. A fotografia é o império soberano da forma retangular. E a gente percebe que todas as experiências já foram feitas com a fotografia, menos a de quebrar a moldura. (Estou exagerando, claro. Pelo que tem de maluco no mundo, tudo que a gente possa imaginar hoje foi feito por um deles cem anos atrás) Seria interessante imaginar negativos fotográficos em forma de estrela, ou de pentágono, ou de meia-lua, ou de cruz, e toda uma estética da fotografia voltada para o enquadramento das imagens do mundo real no interior desses espaços esdrúxulos, espaços que não correspondem à nossa maneira intuitiva de observar seres e ambientes.

São interessantes pelo simples fato de serem formatos contra-intuitivos, ou seja, que violam nossa forma espontânea de pensar. A qual não é tão espontânea assim, é condicionada pela nossa aparelhagem biológica (a tal questão dos olhos ficarem lado a lado) e por razões de ordem prática que ao longo dos milênios fizeram com que chegássemos ao livro retangular (vocês já viram livro redondo?). Por que motivo as notas de dinheiro são retangulares e as moedas redondas, e não o contrário? Certamente porque o papel se corta melhor em retângulos, e para o processo de fundir moedas essa preocupação inexiste (conhecem-se na Antiguidade moedas quadradas e triangulares). Temos a tendência a achar que o formato predominante em nosso Presente é o único, ou o melhor, ou o mais certo. Talvez daqui a cem anos os critérios sejam outros, e estejamos tirando fotos em forma de letra S.

4 comentários:

Fundação Cultural Jornalista Osvaldo Lima disse...

Estão abertas até o dia 15 de novembro as inscrições para o XI FestCampos de Poesia Falada, realizado pela Prefeitura de Campos dos Goytacazes-RJ, através da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima (FCJOL). O objetivo é abrir espaço na cidade para que poetas e atores de todo o Brasil possam criar e mostrar seus talentos na arte de escrever e interpretar. As 20 poesias classificadas para a final serão apresentadas no dia 4 de dezembro. A premiação total é de R$ 11.000,00. Regulamento e ficha de inscrição
aqui.

Anônimo disse...

Engraçado! Pensei numa ponte para outro assunto a partir do teu raciocínio e não consegui desvendar se são as fotografias escravizadas pela moldura ou vice-versa, já que a segunda é 'coadjuvante' da primeira. Estariam um dia talvez, as molduras, livres das imagens? Estariamos nós livres do presente?

Vou colocar o teu texto numa moldura invisível por aqui. ...E esperar pra ver qual o tempo vai esxtinguir primeiro.

Abraços, Braulio!

Laura Fuentes disse...

Fotos são registros de instantes. E teus textos bisturis de pensamentos.
Fiquei feliz por ter encontrado aqui em Sampa, num sebo, um livro esgotado seu. Uma edição da Rocco que traz, juntos, o "Mundo Fantasmo" e "Espinha Dorsal da Memória". Contei pro Edson Cruz e ele admitiu inveja!...rs

Alexandre Gaioto disse...

Vida longa ao blogue, Bráulio!

Abraços!

www.alexandregaioto.blogspot.com