O cinema é o ponto perfeito da ilusão. Se fosse menos bem-feito, ninguém seria convencido a acreditar. Se fosse mais bem-feito do que é, ficaria tão parecido com o Real que começaríamos e bocejar e bateríamos em retirada.
Do jeito que existe até hoje, ele se mantém tremeluzindo no espaço como uma película translúcida por onde perpassa um mundo maior, mais vivo e mais carregado de energia vital do que o nosso. E para fazer brotar esse Mundo De Lá o mundo de cá não mede esforços.
Conta-se que Luchino Visconti, ao dar uma última checada num cenário antes de começar a rodar a cena, abriu uma gaveta de um móvel do quarto: estava vazia. Ele chamou o cenógrafo: “Como é que pode?! A gaveta está vazia!” E o cara: “Mas, Don Luchino, ninguém abre a gaveta na cena!” E ele: “Tá errado... tá errado...” Foi abrindo os armários também vazios e ordenando: “Coloquem aqui dentro todas as roupas dos personagens, do jeito que eles teriam colocado. Isto aqui é um quarto, e não uma mentira”.
Será verdade? Se não for, tomara que fique sendo.
Conta-se uma história parecida sobre um diretor americano, não lembro qual, que igualmente se preparava para filmar a cena culminante do filme, em que a estrela descia triunfante a escadaria da mansão para participar de um baile. Alguém veio lhe mostrar o colar de diamantes que ela estaria usando. Ele examinou e disse: “Isto aqui é uma imitação de 200 dólares. Quero um colar igual, mas de diamantes verdadeiros.” Alguém protestou: “Um colar assim vai custar 100 mil dólares, e ninguém vai saber que é de verdade” Ele respondeu: “A atriz que vai usá-lo saberá”. Macaco velho, ele sabia que uma mulher tem outro porte, outro andar e outro brilho no olho quando tem 100 mil dólares faiscando no pescoço.
Erich von Stroheim, dirigindo no tempo do cinema mudo, exigia que em todos os seus cenários as campainhas da porta funcionassem de verdade. Por que? Porque os atores viram a cabeça com mais naturalidade quando escutam um “blim-blom” do que quando escutam um assistente gritar: “Agora, Fulano, tocaram na porta!”
A ilusão cinematográfica é uma película tênue como bolha de sabão. A menor inverossimilhança pode fazê-la espoucar para sempre, e puxar o espectador, como um elástico super-esticado, de volta para a poltrona, num repelão brusco que parte a sua fantasia em milhões de fragmentos.
Na TV a gente vê uma pessoa falando ao telefone e (quando não é um bom ator) percebe que as pausas e as entonações não são as de uma pessoa conversando, são as de uma pessoa dizendo algumas frases, esperando com um telefone mudo ao ouvido, e depois voltando a falar.
Acho que ficaria mais trabalhoso escrever o diálogo inteiro (mesmo que só um dos lados tivesse que aparecer) e botar um ator ou um assistente do lado oposto intercalando as frases. Mas ficaria muito mais realista o resultado diante da câmara, porque a maioria dos atores não tem esse senso de ritmo nem faz a entonação correta.
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