quarta-feira, 22 de julho de 2009

1167) O poeta de cinco anos (9.12.2006)



Um garoto carioca entrou em 2003 para o “Livro Guiness dos Recordes” como o mais jovem escritor editado em todo o mundo. Seu nome é Matheus de Souza Barra Teixeira, mora no Rio de Janeiro, e sua façanha foi publicar o livro “A Ilha dos Dragões” aos cinco anos de idade, quando ainda não sabia ler nem escrever. O esperto Matheus contou a história em voz alta enquanto tomava banho. Sua mãe gravou tudo, pôs no papel e mandou para a editora.

Ah, ia me esquecendo: Matheus é bisneto da poetisa Cecília Meireles, e sua mãe, Vânia Barra, trabalha como agente literária. O que talvez explique tanto o talento quanto a publicação. No caso de Matheus, existe a consciência de uma linhagem familiar, a compreensível expectativa de que algo das habilidades da bisavó se manifestem na criança. E existe a convicção de que, no momento em que isto aconteça, a imprensa terá um ótimo “gancho” para noticiar o fato.

Não li o livro do menino e não estou aqui para botar defeito, até porque já vi histórias ótimas criadas de improviso por garotos dessa idade. O que não vejo com bons olhos é essa besteira de “entrar para o Guiness”. Pelo menos o menino o fez através de uma atividade interessante, e não com uma idiotice como “o cara que comeu mais repolhos pendurado de cabeça para baixo” ou “a mulher que repetiu a mesma palavra 100 mil vezes sem parar para dormir ou para comer”. O Guiness era de início um divertido registro de coisas fora do comum. Hoje em dia virou um manual de estímulo à insensatez quantitativa.

O caso de Matheus lembra a francesa Minou Drouet, que aos sete anos publicou um livro de versos. Os críticos se dividiram. Uns anunciavam que havia surgido “um Mozart da poesia”. Outros diziam que os poemas não eram escritos pela garota, e sim por sua mãe. Outros, por fim, diziam apenas que os poemas não eram bons. Jean Cocteau, com sua ironia peculiar, afirmou que “todas as crianças são gênios, menos Minou Drouet”.

Temos crianças-prodígio na música, como Mozart e tantos outros; também na matemática, como Gauss e tantos outros. E nenhum na literatura. Fiquei agora uns quinze minutos remexendo nas poeiras da memória em busca de uma criança que publicou um livro notável com menos de dez anos, e só me veio à cabeça Minou Drouet. Será que escrever um romance é mais difícil do que redescobrir sozinho as proposições geométricas de Euclides, como fez Pascal na infância? Talvez a matemática seja um sistema ordenado e infalível no qual basta aplicar as regras e ousar imaginar variações. Músicos e matemáticos têm, ao fim e ao cabo, o mesmo tipo de talento, que uns manifestam em forma de combinações sonoras e os outros em forma de cálculos abstratos. Mas um romance requer algo mais. Requer conhecimento em-360-graus da vida e do mundo, requer estrada, requer experiência, requer conhecimento de como as pessoas são e pensam – e isso uma criança não tem como compreender.

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