Fui ver o show do “Slayer” na Fundição Progresso. Não, amigos, não sou um apreciador do heavy-metal; fui por solidariedade familiar para com a nova geração. E fui para ver se é verdade que os shows dessas bandas são rituais satânicos de gente drogada e bêbada.
Confesso que não vi nada disso. Foi um dos shows mais tranqüilos que assisti na última década, e a única violência foi a cometida contra meus tímpanos, que estão zoando até hoje. Na hora que o bicho pega, a turma do gargarejo entrega-se a uma dança selvática na base do mete-o-cotovelo, mas vou ser sincero: coisa muito mais braba eu já passei na Rua do Amparo, seguindo o Homem da Meia Noite.
O vocalista da banda é um Hagrid (de “Harry Potter”) coloquial na fala e estentórico no canto.
O guitarrista, um marcos-valério de cavanhaque mongol, é mais ligeiro-de-dedo do que Jacob do Bandolim.
Há outro guitarrista cujo rosto ficou oculto sob uma cascata fulva, e também não vi o baterista, soterrado sob uma cordilheira de tambores e fumaça multicor, mas abrindo caminho valentemente, tendo numa mão o martelo de Thor e na outra o machado de Xangô.
É uma música brutal, que parece consistir apenas de blasfêmias, cabeçadas, bíceps e decibéis. Curiosamente, a banda baiana Ungodly, que fez o show de abertura, é mais caricata, teatral e posuda do que a banda norte-americana (que já tinha tocado no Brasil há doze anos). Era como ver uma luta de tele-catch e depois ver uma luta de verdade.
A platéia de cinco mil pessoas (segundo “O Globo”) era majoritariamente na faixa dos 20-30 anos, mas havia uma galera adolescente, e um respeitável contingente de sujeitos já meio gordos, com cabelos grisalhos batendo na cintura. Por mais de vinte vezes julguei ter avistado Alex Madureira ou Paulinho Rafael. E todo mundo de camisa preta.
São satanistas, são adoradores de Belzebu? Não acredito. São jovens que flertam com o lado escuro da Força, mas quando viram adultos não se transformam em Darth Vaders. Perdem a ingenuidade infantil e se tornam Han Solo.
Cultivam uma energia agressiva, mas é uma energia sem maldade, de natureza hormonal e de descarga centrífuga. Sai tudo no suor e no berro. E no ritual bizarro em que surram as próprias costas com os cabelos, o que me lembra o fanatismo dos xiitas que se chicoteiam ritmicamente durante as peregrinações.
Dizem que de vez em quando um deles comete um crime, mas, francamente, mais violentos do que eles são as torcidas organizadas do futebol brasileiro. A música que fazem tem peso bastante para garantir a combustão de toda a testosterona e megalomania produzida ali, num resultado de soma-zero que leva todo mundo para casa, após o show, pacificado e purgado pela catarse coletiva.
E agora descobri porque as bandas de rock exigem 120 toalhas no camarim. É porque se faltar toalha eles têm que enxugar o cabelo no palco, balançando assim, assim, assim, assim...
Um comentário:
Braulio,
Estou em minhas andanças poéticas, que maravilha me deparar com esse seu espaço!Parabéns!!Maravilhoso!
Voltarei sempre!
Abraços,
Reggina Moon
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