quarta-feira, 30 de junho de 2010

2208) O direito de imagem (6.4.2010)



De vez em quando sai uma história desse tipo na imprensa. Desta vez, pelo que vi nos jornais, foram os herdeiros de Manuel Bandeira que fizeram retirar do mercado um livro de fotos do fotógrafo José Medeiros, só porque em determinada página do livro aparecia uma foto de Bandeira ao lado de outras pessoas. O absurdo de uma tal situação me lembra o que ocorreu anos atrás quando o cineasta Rosemberg Cariry, no Ceará, fez um filme sobre os cangaceiros Corisco e Dadá; os herdeiros de Dadá exigiram uma indenização pelo uso da imagem, e a indenização era maior que o próprio orçamento do filme.

Parece uma lei da Natureza, esse negócio de ter que ir de um extremo ao outro, de sair de uma situação de total permissividade para uma de total repressão, de um estado de coisas em que tudo é de graça para outro em que tudo é pago. Abusos do direito de imagem sempre foram cometidos. Eu sou um jogador de futevôlei, fui fotografado jogando na praia, alguém usou a foto sem autorização na capa de um guia turístico. Eu sou uma modelo, desfilei usando uma roupa, e a cena do desfile é utilizada num comercial. Eu sou um sujeito famoso, tomei uma cerveja com amigos, fui fotografado, e minha foto apareceu numa propaganda da cerveja. Tudo isto são usos indevidos de imagem ou de um trabalho, e é claro que precisa haver uma regulamentação para disciplinar esse uso. De preferência, remunerando o dono da imagem; no mínimo, pedindo sua autorização.

O que acontece é que processos bem sucedidos contra o uso não-autorizado da imagem de alguém acabam criando uma situação esquisita, em que essas ações judiciais se transformam numa indústria lucrativa. Detentores dos direitos sobre uma imagem deflagram processo atrás de processo e fazem disso um meio de vida. Num texto divulgado pela Internet a respeito do episódio de Manuel Bandeira, o poeta Alexei Bueno afirma: “Há um princípio jurídico de grande importância, o da razoabilidade, que está sendo atropelado por todas essas aberrações. E mais: um sinal óbvio de civilização são os limites à propriedade, em nome do bem comum, inclusive o bem cultural. Maior exemplo não existe do que o tombamento. Se Ouro Preto não tivesse sido declarada Monumento Nacional nos anos de 1930, todas as suas casas seriam hoje cubos de concreto, com janelas basculantes de vidro blindex! Se há limites de propriedade para os bens físicos, por que não os haveria para bens imateriais, como as obras literárias, às vezes de muito maior importância?”

Por conta dessa ânsia de faturamento com imagem (e por medo dos processos resultantes) trabalhar com TV virou um pesadelo. Se você filma uma cena em que aparecem 30 pessoas, tem que pegar 30 autorizações preenchidas e assinadas, para evitar um processo. Se o “princípio da razoabilidade” existe, precisa ser posto em prática para que se distinga com clareza o que é boa ou má fé, pois há muitas maneiras de se faturar injustamente com a imagem alheia.

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