quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

0670) Blowin’ in the Wind (12.5.2005)



Falei dias atrás sobre “Asa Branca” e o fato de ela ser uma grande pequena canção, sem grande riqueza musical, mas que por vários motivos tornou-se uma canção marcante, simbólica. Não é a única assim. De imediato me lembrei de “Blowin’ in the Wind”, a canção de Bob Dylan que tornou-se um hino do movimento pelos Direitos Civis. É uma das músicas mais conhecidas do cancioneiro norte-americano, e é uma coisa “desse tamanhinho”. Tem dez centavos de melodia, mas tem uma letra com imagens fortes, evocativas, e suficientemente amplas para poderem se encaixar em qualquer situação: “Quantas estradas um homem tem que percorrer, até ser considerado um homem? Quantos mares uma gaivota tem que cruzar, antes de poder dormir na areia? Por quanto tempo as balas de canhão ainda vão voar, antes de serem banidas para sempre? A resposta, meu amigo, está soprando no vento”.

Não tem a complexidade, a originalidade, o impacto poético-musical de outras canções de Dylan como “Hurricane”, “Jokerman”, “Brownsville Girl”, “Tangled up in Blue”. Nosso primeiro impulso é achar que é justamente esta simplicidade, esta acessibilidade, que fez o seu sucesso, mas... músicas de três acordes é só o que tem por aí, e nenhuma delas vira o hino de uma geração inteira. É preciso a confluência de uma série de coisas, e aí não deixo de pensar que quem faz a força destas canções é acima de tudo sua letra.

Um caso parecido é o de “Caminhando” de Geraldo Vandré (“Caminhando e cantando, e seguindo a canção...”). Certa vez a Veja fez uma matéria sobre Vandré e usou o título: “Ele compôs a Marselhesa e não sabia”. Vandré provavelmente não imaginava que sua música teria um impacto tão duradouro. Era uma musiquinha de apenas dois acordes, e com todas as rimas em “ão”; era quase uma caricatura de tudo que a MPB não era no momento. Para quem se lembra, a MPB estava dividida entre a sofisticação harmônica e poética de Tom Jobim e Chico Buarque (que acabaram ganhando aquele festival com “Sabiá”), e a exuberância tropicalista em letras, melodias, arranjos, figurinos, atitudes. Sem se identificar com nenhuma destas tendências, Vandré infiltrou uma canção propositalmente minimalista, rudimentar, com um discurso poético explícito, sem sutilezas. E entrou para a História.

“Caminhando” é o contrário de canções complexas como “Disparada” (em parceria com Théo de Barros), “Aroeira”, “Pequeno Concerto que Virou Canção” e outras preciosidades que Vandré mostrou ser capaz de criar. Assim como ocorre com “Asa Branca” e “Blowin’ in the Wind”, são dez-tostões de melodia que qualquer um é capaz de cantarolar ou de acompanhar ao violão, e quem faz a canção decolar é na verdade a letra. Melodias simples junto a letras de alto impacto são uma descrição adequada para estas canções, que fazem torcer o nariz dos músicos sofisticados, mas que corresponderam, em um momento histórico específico, a alguma coisa que todo mundo estava com vontade de dizer.

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