quarta-feira, 22 de agosto de 2012

2956) Imperativo tecnológico (22.8.2012)




Quando falamos na possibilidade de surgimento de uma Inteligência Artificial (e este “nós” implícito inclui escritores de ficção científica, jornalistas, cientistas, diletantes da ciência) temos a tendência de personalizar essas inteligências numa figura reconhecível: o robô que raciocina como ser humano e chega até a se emocionar ou ter problemas éticos; o computador capaz de dialogar conosco, dar conselhos, tomar decisões; o software capaz de psicanalisar um paciente de carne e osso; etc.  No entanto, pode ser que essa inteligência não tenha como modelo o cérebro humano, e sim a colmeia de insetos, o formigueiro de funções especializadas. Máquinas diferentes exercerão funções diferentes numa Gestalt que para elas é um ponto pacífico, algo cuja existência ou necessidade nem sequer se discute; e que nós, humanos, só perceberemos de maneira indireta, caótica, desesperada.  Ela estará administrando, invisível e não-localizada, a nossa vida; e não saberemos qual a tomada que deve ser puxada para desligar essa força.

Marc Andreessen é o criador do Mosaic e do Netscape, os primeiros browsers de viajar na Web. Falando sobre seus projetos atuais com a “Nuvem” (o conjunto de processos e aplicativos na Web, uma espécie de banco-de-dados e CPU de todo mundo), à revista Wired, ele comentou: “Nossa idéia era deixar o processo de computação fora da máquina do usuário, sendo realizada na rede. É algo inerente à tecnologia, é o que alguns pensadores chamam de ‘imperativo tecnológico’. É como se a tecnologia quisesse que aquilo acontecesse”.

Qualquer pessoa que trabalhe num processo de criação experimenta esse tipo de coisa. “Acho que essa música tá pedindo um refrão”. “O filme está precisando de um pouco mais de velocidade no final”. “Essa peça está implorando por uns números musicais pra quebrar a tensão”.  E assim por diante.  Quando estamos trabalhando na criação de um processo complexo como uma obra de arte ou uma nova tecnologia, chega sempre um estágio em que nos sentimos como que atendendo aos pedidos ou às exigências de uma inteligência que se serve da nossa, localizada fora da nossa.  Ela reside num domínio a que temos acesso (a obra) mas que está fora de nós, está sujeita a interferências de outras pessoas, e, meio misteriosamente, parece ser capaz de querer coisas por conta própria. “Nem tudo já está na Nuvem”, diz Andreessen, “mas eventualmente a tecnologia vai querer que esteja tudo lá”.  As novas tecnologias pedem a criação de novíssimas tecnologias, numa bola de neve em que nos limitamos a aperfeiçoar essa inteligência coletiva, impessoal, insetóide.

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