quinta-feira, 3 de maio de 2012

2860) O Duque de Nevroskni (3.5.2012)





(foto: Yves Lecoq)

“Eu, Padre Martinovic, nos derradeiros instantes de minha vida terrena, rumo ao castigo eterno que espera minha alma, redijo estas linhas para que se faça luz e verdade sobre os acontecimentos que infelicitaram o ducado de Nevroskni, em cuja paróquia preguei por 43 anos. Sabe-se que o Duque era um homem severo e recluso, e que suas propriedades tinham se reduzido a algumas léguas de terra e um pequeno castelo. No outono de 1645, o Cavaleiro de Peshkar, enviado do Rei Marvinius IV, apresentou-se ao Burgomestre. Segundo ele, a corte fervilhava de suspeitas de que o Duque, cuja propensão às ciências ocultas era notória, teria sido infectado com a praga do vampirismo. O Burgomestre convocou às pressas o Conselho dos Anciãos, e todos ponderaram que nos últimos anos numerosos aldeões tinham desaparecido sem explicação, e que alguns corpos tinham sido encontrados com as marcas vampíricas na garganta, levando as autoridades a performar o ritual cabível e sepultá-los em tumbas protegidas. Diante da gravidade das acusações, o Burgomestre designou dois cidadãos locais, o ferreiro Olink e o mercador Ambudrys, homens expeditos e corajosos, para acompanharem o Cavaleiro de Peshkar ao castelo. Ao retornar da incursão, os três trouxeram notícias terríveis. Entrando no castelo às escondidas, haviam encontrado no porão um cenário nefando de objetos sacrílegos, e num ataúde cheio de terra o Duque, adormecido, com a boca manchada de sangue. Uma expedição punitiva foi montada às pressas, incluindo o Burgomestre, alguns membros do Conselho, os três emissários autores da descoberta, e eu próprio, como representante da Igreja. Persigno-me novamente ao repetir que tudo foi encontrado conforme o relato dos três investigadores, e que o horror que sentíamos não nos impediu de cumprir nosso dever cristão de dar a pacificação final àquela alma mediante a estaca, a decapitação, o fogo e a aspersão de água benta sobre as cinzas. A paz voltou a reinar no Ducado. O Rei outorgou ao Cavaleiro de Peshkar o castelo e os domínios do anticristo extinto; o ferreiro Olink e o mercador Ambudrys receberam títulos nobiliárquicos. E no inverno de 1645, coube-me ministrar a unção final a este último, que me confessou terem eles, mancomunados com o Cavaleiro, subjugado e narcotizado o Duque e preparado o cenário demoníaco do porão, inclusive o sangue na boca da vítima, para justificar sua execução sumária. Isto me foi dito em segredo de confissão, mas é um segredo pesado demais para que eu o leve comigo para o lugar que me espera por trair os sacramentos de Deus e revelar aos homens essa verdade, antes de pôr um merecido fim aos meus dias”.

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