(ilustração: Marc Chagall)
Os dois dizem ser russos de nascimento (Ele: “Minha infância
foi em preto e branco. Descobri a cor quando vi o mar, com quatro anos.”),
emigrados na infância (Ela: “Eu não lembro de nada, amorrr, me trouxeram
vendidona, passiva, quando eu soube que existia já era brasileira”). Só vieram
a se conhecer no Brasil, já brasileiros e cariocas ambos, numa festa da
faculdade, onde se esbarraram (Ele: “Alguém esbarrou em mim e minha bebida
derramou na roupa dela, e quando percebi estava tirando a roupa dela para que
ela não pegasse um resfriado”), se apresentaram, se maravilharam um com o
outro, se envolveram e não se largaram mais. (Ela: “O segredo de segurar um
marido, amorrr, é um só em qualquer idioma.”)
O pai de Andrei era engenheiro aéreo e ganhava um belo
salário, além de uma nota preta com umas geringonças que ele e uns colegas
inventaram. (Ele: “BT, grava o que eu tou te falando: Enquanto eu estiver no
trono, o reino é de vocês. Não esqueça isso, e me cobre.”) A família de Kalina
se estabeleceu no Nordeste, somente os pais dela que preferiram o Rio. (Ela:
“Eles gostaram dessa sacanagem daqui, meu amorrr, eles gostaram de viver num
lugar onde não se batalhava meses para chegar aos finalmentes, cê entende?”).
Andrei era um cara enorme, terno, emotivo, mas podia ficar violento de um
segundo para outro. (Ele: “O cara da mesa ao lado foi grosso com o garçom. Eu
não pretendia dar aquele prejuízo ao dono do restaurante”). Os dois eram meio
infiéis um ao outro, discutiam em altas vozes e meia hora depois estavam aos
beijos (Ela: “A mulher tem que ter pose de rainha, inclusive quando está
amassando os culhões de um sujeitinho que não presta, como esse meu, que nunca
vai prestar, só se salva porque eu o amo.”).
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