Uma das piores coisas que podem acontecer durante uma discussão sobre literatura e mercado editorial é alguém aludir a Stephen King, J. K. Rowling ou Paulo Coelho para dar exemplo seja lá do que for. Esse pessoal que vende milhões passa para o autor novato a idéia de que o objetivo dele deve ser, também, vender milhões de cópias, o que é um erro. Na pressa de atingir esse número irreal, ele vai se oferecer pra “transar com Deus e com o lobisomem”, como dizia o parceiro do autor de O Alquimista. Não vai conseguir, e talvez acabe entrando para o clube azedo e ressentido dos que dizem: “Pois é... um país que não lê... ah, se eu escrevesse em inglês...”
Vender dez milhões de exemplares não pode ser o objetivo
de ninguém que publica um livro, ainda mais se for um livro de estréia. É um
objetivo irreal, que chega à beira do absurdo, mas mesmo assim vejo muitos
autores jovens e autoconfiantes dizerem: “Se a série Crepúsculo vendeu tanto
assim, por que um livro meu não pode vender também?”. Isso, minha gente, não é um objetivo, é um
desejo. Todo mundo é livre para desejar
o que quiser, sonhar com o que bem entender.
Mas isso não pode ser confundido com um objetivo. Objetivo é algo que está no horizonte do
possível, algo que pode ser planejado e cumprido.
Quando Dan Brown ou Stephen King fazem a tiragem inicial
de um livro novo com um milhão de exemplares, isso não é um desejo, é um
objetivo. Toda a história anterior da
vendagem do autor o autoriza a imprimir um milhão de cópias de uma tacada só.
Ele já sabe que é possível vendê-las. (Às vezes encalha; às vezes, dependendo
da aceitação do livro, mesmo Brown ou Coelho levam anos para vender essa
tiragem inicial. Mas o objetivo era fundamentado, sim.)
Meus livros têm em geral uma tiragem de 2 ou 3 mil
exemplares, que é a tiragem padrão do mercado brasileiro. Alguns já venderam 40 ou 50 mil, mas nem por
isto eu coloco esse número como um objetivo. Se rolar, beleza. Mas o bom senso aconselha, a mim e aos
editores, ir de pouquinho, sentindo a resposta do público, e preparando
tiragens maiores se a gente vir que a aceitação é boa.
Esse mercado literário, as vezes me surpreende. E o que diremos de um escritor "marginal" com seus 100 livros lidos? Limitar o escritor ao número é perder o prazer do novo, e outra: defendo a meta de um único livro lido, mas bem degustado.
ResponderExcluirEstudo literatura nos muros de João Pessoa, e afirmo na dissertação que aqueles que escrevem no muro e nunca lançaram um livro sequer são escritores.
(talvez, estes, tenham mais leitores do que as grandes tiragens presas na livraria).
Kalyne, vocês que mexem com cinema têm uma noção muito mais realista do que é "público". A literatura é uma coisa meio cabra-cega, é você falando num microfone sem saber se tem gente ou não no auditório.
ResponderExcluirTodos os novatos da literatura fantástica brasileira e sua megalomania, tanto de pretensão de sucesso imediato, quanto de extensão de suas sagas, deveriam ler esse texto todo dia.
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