sábado, 11 de janeiro de 2014

3393) A moeda do tempo (11.1.2014)




(Ilustração: Edward Gorey)


De vez em quando a gente entra nas redes sociais e começa a fazer brincadeiras com os amigos: “Seis posts na última meia hora? Vai trabalhar, vagabundo!”. Há uma mistura de seriedade e de gracejo nisso, principalmente entre aqueles cujo trabalho exige que fiquem o dia inteiro sentados na frente do computador. Escritores, tradutores, jornalistas... Ou mesmo pessoas que têm outras ocupações, mas de tanto em tanto tempo sentam diante do monitor, checam o que os amigos andaram postando, comentam, compartilham, envolvem-se em debates, fazem piadas.

Nada impede que essa aparente falta de ocupação esteja sendo exercida nos intervalos de um trabalho duro, e da minha parte nada melhor para descansar de uma hora intensa de escrita ou de tradução do que 15 minutos num Twitter ou Facebook peruando as polêmicas alheias, ou conferindo um clip musical, uma notícia quente. A gente volta ao trabalho com a mente relaxada, pronto para mais uma hora de enfrentamento. (O único prejuízo é do corpo, que continua escravizado ao teclado e à cadeira giratória.)

Estou perdendo meu tempo? Não acho. Perdia muito mais quando tinha TV na sala e no quarto e, sob o pretexto de “descansar a coluna”, me deitava às 3 da tarde nas almofadas, ligava a Máquina de Fazer Doido, e só emergia dali quando começava a novela das 8, porque afinal tudo tem um limite. Cinco anos atrás eu via uma média de 5 a 6 horas de televisão por dia; hoje em geral vejo quatro por semana (um jogo na quarta, outro no domingo, e olhe lá.)

O poeta Carl Sandburg disse: “O tempo é a moeda que você tem para negociar sua vida. É a única, e só você pode dizer como ela vai ser gasta. Tenha cuidado, não deixe que as outras pessoas a acabem gastando, em vez de você”. Chega um momento na vida em que eu olho minhas estantes repletas de tesouros inestimáveis e sei que não vou poder ler aquilo tudo. Eu seria capaz de escrever um livro sobre cada livro que tenho na minha biblioteca; mas não vai dar tempo. Gastei, gastei demais minha moeda, e se alguém vier me censurar minhas noitadas de botequim e violão eu direi que ao contrário, aquilo foi tempo bem investido e bem recompensado. O desperdício, amigo, é o programa de auditório que você fica olhando sem ver, só porque a TV está ligada; o filme bobo que você já viu, ou que está achando chato mas vê mesmo assim; o talk-show com gente cheia de caras e bocas e sem nada para dizer; o pseudo-noticiário de fatos cuja verdadeira versão você acabou de ler num blog confiável. O tempo não é um recurso renovável. Pior do que isto, é uma conta bancária de onde a gente retira um dia por dia, sem nem saber quanto falta para zerar o saldo.


2 comentários:

  1. Genial!
    "Máquina de Fazer Doido" - adotei o termo! rs

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  2. Quem deu esse apelido à TV, Tiago, foi o saudoso Stanislaw Ponte Preta (pseudônimo de Sérgio Porto).

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