Um ateu tem certeza de que Deus não existe; um agnóstico
acha que não há como saber, neste momento, se isso é verdade ou não. (Segundo
Ariano Suassuna há uma terceira categoria, o herege, que diz: “Eu acredito em
Deus, sim, mas antipatizo com ele”). O agnóstico em geral não antipatiza com a
religião. Ele talvez tenha tido uma formação científica e tem o hábito de
proceder por análises, argumentos e exames de provas. Se alguém quiser usar
esse método para descobrir se Deus existe ou não, vai ter uma certa dificuldade.
É possível provar verbalmente a existência de Deus, com argumentos teológicos;
mas os mesmos argumentos serviriam para provar a existência de numerosas outras
coisas. Se as premissas forem bem escolhidas, e forem aceitas pelo
interlocutor, pode-se provar seja lá o que for.
Algumas pessoas religiosas dizem que a fé é espontânea,
nasce de uma iluminação íntima, e não de uma discussão filosófica. Neste caso
(dizem os agnósticos), estou aqui até hoje, esperando essa iluminação que no
meu caso não aconteceu. Como dizia Darcy Ribeiro, “Deus me conhece, sabe onde
eu moro, e se quisesse que eu acreditasse nele já tinha providenciado”.
Um agnóstico respeita as religiões pelo mesmo motivo por que
respeita as literaturas. São construções do espírito humano, onde projetamos
nossas visões do mundo, nossos comentários sobre a condição humana, sobre os
nossos medos, nossas aspirações, nossas visões a respeito de tudo que
transcende nossa vida: o infinito, a eternidade, etc. As religiões são ficções
organizadas que tentam dar um sentido a tudo que vemos e descobrimos sobre o
mundo. O Islã, o Cristianismo e o Judaísmo são o produto de três culturas
diferentes. A visão que elas nos dão sobre Deus está inextricavelmente tecida
com seus relatos históricos, os preceitos sociais e morais de cada uma, os seus
mitos e seus ritos. O agnóstico não vê neles revelações divinas; vê documentos
humanos, da maior importância, mesmo que não sejam factualmente verdadeiros –
tal como ocorre com o teatro universal, o romance, a poesia épica. Pouco
importa se Ulisses existiu ou não, isto não diminui o valor da Odisséia. O
mesmo se dá com os livros sagrados.
Oi Bráulio,
ResponderExcluirHá poucos dias estava conversando sobre o ser ou não agnóstico com a minha esposa. Por isso achei curioso te ver escrever sobre isso hoje. Acontece que até hoje não entendo muito bem o posicionamento de quem se declara Agnóstico. Explico melhor. Eu entendo que o cidadão pense que não há como saber se deus existe ou não (inclusive eu concordo com esse pensamento: não há como saber). Mas além disso, há de se ter alguma opinião pessoal à respeito, não? Eu penso que não se pode provar a existência ou não de deus, não se pode conhecer a verdade sobre isso. Mas fora isso tenho também a minha visão ateísta. Entendo também que a pessoa possa ter uma visão agnóstica e teísta. Mas não consigo compreender exatamente a visão puramente agnóstica. Como funciona pra vocês? Ora acreditam e ora não acreditam? Uma eterna dúvida?
Sou seu fã.
Abraços
Excelente postagem. Fé é uma coisa de dentro para fora. Não se pode impor a quem quer que seja!
ResponderExcluirFlávio, é uma questão de considerar a questão muito relevante ou pouco relevante. É como se alguém me perguntasse: "Será que na Nebulosa de Andrômeda, em algum planeta gasoso, existe uma forma de vida inteligente?". Eu daria a mesma resposta: "Não há como saber, então, cada um pensa o que quiser e vai cuidar de coisas realmente importantes."
ResponderExcluirTalvez uma das dificuldades ao tentar entender o conceito de Deus advenha de geralmente cairmos em dois extremos: de um lado a antropomorfizacao e do outro a "forca da natureza".
ResponderExcluirQuando assume-se que Deus eh uma inteligencia, quase que automaticamente associamos uma "personalidade" ou modo de agir/raciocinar semelhante ao humano.
Ora, SE Deus existir e for a inteligencia suprema (e supremo nas qualidades dai resultantes), nenhuma acao dele sera pautada pela limitada visao humana. Podemos esperar, entretanto, que com o caminhar da humanidade e dentro de um tempo X (milenios ? milhares de anos ? bilhoes ?) a evolucao do pensamento humano permita compreender melhor estas motivacoes.
No outro extremo, quando tiramos a inteligencia e/ou consciencia de Deus, caimos na forca da natureza - uma visao algo caotica, ainda que levemente organizada pela constantes universais, donde a sorte/probalidades definem o que acontece ou nao.
Se Deus existe ou nao ? Me parece um pouco quando desconheciamos o mundo ao nosso redor: nao importa se acho que a Terra seja achatada - ela de fato eh redonda (ou quase), nao importa se nao vejo atomos - eles constroem a estrutura da materia, nao importa se nao vejo microbios a olho nu - eles proliferarao doencas se nao fizer a higiene basica.
Talvez tudo seja fruto do acaso - das milhares de combinacoes possiveis de atomos, moleculas, aminoacidos - gerando o cosmos e vida. Ou talvez exista um timoneiro insondavel dirigindo tudo isso.
Agnóstico: um ateu desconfiado. Ou por outra, ateu ou religioso, as duas posições parecem carecer de certo fervor. Os dois acreditam ou desacreditam, mas ambos saltam no abismo. O agnóstico, talvez, seja preguiçoso demais para as grandes quedas.
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ResponderExcluirDos seus textos não ficcionais, para mim este é um dos mais certeiros com relação à visão que tenho de mundo.
ResponderExcluirÉ exatamente por isto que me considero agnóstico e que me interesso por religiões, pelos mitos que elas carregam -- o que é um outro modo de dizer que é pela literatura que elas trazem no bojo.
É curioso pensar que uma das validações da literatura é esse aspecto de entendimento do mundo e como ele se associa com uma visão de fé, que é, antes de tudo, fiar-se a narrativas.