Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
quinta-feira, 15 de julho de 2010
2267) Análise Semântica do “Tá Ligado?” (13.6.2010)
Por que motivo os jovens de hoje (e os malucos em geral) pontuam suas frases com um reiterante “tá ligado?”. Quando converso com alguns amigos meus, cada vez que eles me perguntam se eu tô ligado sinto o impulso de responder que tô. Nossos diálogos ficam com um perfil meio nonsense: “BT, preciso falar contigo uma coisa, tá ligado?” “Tô. O que é?” “Amanhã de noite vai uma galera lá em casa, tá ligado?” “Tô. Quem são?” “É um pessoal de fora, mas que é fã das tuas músicas, tá ligado?” “Tô. E daí?” “Eles queriam que tu aparecesse lá pra dar uma palhinha no violão, tá ligado?” “Tô. Que horas vai ser?” E assim por diante. Todas as vezes que faço assim, eles me perguntam por que eu estou falando de um jeito tão estranho.
Em busca das origens dessa expressão lembrei-me do “está lá?” que os portugueses usam ao telefone. São semanticamente equivalentes. Quem diz isso quer saber se o canal de comunicação está aberto e funcionando, se não houve nenhum corte. Maldo que a origem da expressão lusitana se deu numa época em que as conexões telefônicas eram precárias, e quando alguém falava mais longamente, sem ouvir nada do lado oposto da linha, tinha um certo receio de que a ligação tivesse caído. Era preciso perguntar se o outro ainda “estava lá”.
O “tá ligado” pode servir também como um sinal de pontuação, marcando o fim de uma mensagem. Mais ou menos como aquelas comunicações por “walkie-talkie” ou outros tipos de rádio em que (por alguma razão técnica que não entendo por completo) o fluxo da transmissão não permite que as duas partes falem e se ouçam ao mesmo tempo (como ocorre com o telefone normal, onde mesmo quando superpomos nossa voz para interromper o interlocutor continuamos a ouvir sua voz ao mesmo tempo que a nossa). No rádio, o fluxo é unívoco, ou seja, ou está todo indo numa direção ou todo na direção oposta. Cada um tem sua vez de falar, e por isso é necessário avisar que a fala terminou: “Alô, estamos sobrevoando o campo de pouso, precisamos de instruções, câmbio”. A palavra câmbio indica, no caso, troca , mudança de interlocutor; serve para dizer ao outro que é sua vez de falar.
Uma outra teoria vai mais longe, e talvez seja uma teoria espúria, mas vale o registro. Afirma-se que o uso regular (ainda que em doses pequenas) de plantas alucinógenas desenvolve nos indivíduos as faculdades telepáticas que o ser humano possui de nascença, mas que foram atrofiadas pelo estilo de civilização que criamos, em que a comunicação verbal e gestual rapidamente tornou obsoleta a telepatia. O uso dessas plantas possibilita ao indivíduo ficar “ligado” na mente do interlocutor, enviando-lhe o que pensa e recebendo a resposta que intuitivamente produzimos quando nos preparamos para falar. A comunicação verbal é mera formalidade, mero reforço. Na verdade nossas mentes estão em ligação direta quando falamos, por isso é sempre necessário checar se a ligação tá boa, tá ligado?
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