Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
quarta-feira, 23 de junho de 2010
2176) O super-capitalismo (27.2.2010)
As redes de relacionamento via Internet (Orkut, Twitter, Facebook, MySpace, etc.) são como as praças de antigamente: um lugar onde vamos passear, na esperança de reencontrar amigos e de fazer novas amizades. Digo as praças de antigamente, não porque elas não existam mais, mas porque estão virando um Zoológico humano onde os pobres, do lado de fora, espremem o rosto entre as grades para ver a classe média passeando lá dentro, protegida, dando banho de sol nos seus bebês, jogando dominó, lendo o jornal de manhã cedo. Se tirarem as grades a mendicância invade aquilo com gosto de gás, como o fez com a casa de Viridiana, a personificação buñuelesca da classe média bem intencionada.
Redes de relacionamento substituem esses espaços problemáticos, mas não são um logradouro virtual onde a gente passeia sem compromisso. Parecem mais com um Clube, onde você precisa se cadastrar para ter acesso; e onde cada passo seu, cada atitude, cada escolha, cada clique, fica gravado na memória do sistema de modo mais indelével do que nas Tábuas de Moisés. Não se engane, amigo. Cada link que você percute com o dedinho do cursor fica registrado numa gigantesca biografia cibernética que o sistema está criando sobre você. Porque saber quem é você é o objetivo desse sistema. A criação das redes de convivência é o pretexto mais simples para fazer com que você se cadastre para entrar, e a cada dia vá refinando seu cadastro, o que você faz clicando em músicas e filmes, dando nota ou palpite sobre os palpites e as notas dos outros usuários, jogando joguinhos inúteis (porque interessa ao sistema saber que você dispõe de, digamos, três horas e 42 minutos diários para jogar, digamos, FarmVille).
O objetivo final do Super Capitalismo é chegar um dia ao requinte de poder tratar por “você” cada cidadão, sabendo exatamente com quem está falando, porque já mapeou seus dados biográficos, seu perfil biológico, seu histórico escolar, seu curriculum vitae, sua história médica, seus hábitos de consumidor, suas propensões ideológicas, suas fidelidades políticas e religiosas, seu estilo de vida doméstico, suas preferências e especialidades sexuais, suas idiossincrasias como consumidor. O super-capitalismo terá uma super-ficha, nestes termos, sobre cada um entre bilhões de cidadãos. E seu sonho (somente um sonho; isto é irrealizável) é ser capaz de produzir as coisas para agradar a você. Ser capaz de lhe oferecer roupas nas suas medidas, nos seus modelos, cores, texturas e estilos de sua preferência. Ser capaz de mandar fabricar uma pasta de dentes planejada e concebida para você, pesquisada de acordo com suas preferências de cor, de sabor, de cheiro, de espessura, de formato e de design do tubo. Ser capaz de produzir um automóvel feito com tudo que você gosta, otimizando e harmonizando fatores conflitantes como beleza, desempenho, segurança e preço. (Isto se o Super Capitalismo der certo; se não der, o mundo será um Haiti.)
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