Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
quinta-feira, 29 de abril de 2010
1972) A Jovíssima Guarda (4.7.2009)
Os puristas irão torcer o nariz diante do superlativo do título, mas sinto muito, a Língua se faz com “a contribuição milionária de todos os erros”, como disse Oswald de Andrade. Passemos ao assunto. Vi dias atrás, pela primeira vez, um show do Skank, o que não deixa de ser surpreendente, pois o grupo mineiro está na estrada há pelo menos uns quinze anos. Não é um dos meus preferidos. As bandas do Rock Brasil que sempre ouvi com prazer são Paralamas, Titãs e Barão Vermelho. Mas por trás destas existem, ou existiram, pelo menos umas vinte em cujo rock em vejo qualidades, mesmo quando tende para o lado bobinho do Kid Abelha ou o lado truculento do Sepultura.
O que ficou martelando com insistência no meu juízo, durante o show do Skank, foi a enorme distância entre essas bandas e as bandas que eu próprio ouvi no começo da adolescência, nos tempos da Jovem Guarda. Muita gente vê a Jovem Guarda com nostalgia, dizendo que “eram tempos mais puros”, e reclama que o rock dos anos 1980 em diante foi um movimento comercialesco, manipulado pelas gravadoras multinacionais. Parece. Mas não é.
Vejo com o maior carinho a Jovem Guarda dos anos 1960. Se deixarem, sou capaz de pegar o violão e tocar 50 músicas seguidas sem errar a letra. Bom ou mau, aquilo fez parte da minha formação, e sou capaz de me despir de qualquer intenção crítica ao cantar músicas de Wanderléia, Golden Boys, Renato e Seus Blue Caps, Os Vips, Jerry Adriani, Bobby de Carlo... São bobinhas? Sem dúvida. Mas eu as conheci numa época em que era tão bobinho quanto elas. Tocá-las e cantá-las, de misturada com a MPB e o Tropicalismo nascentes, dava a sensação de lidar com algo confortavelmente unidimensional.
Com poucas exceções, as letras da Jovem Guarda eram no nível mental dos gibis de Luluzinha ou Pato Donald. As versões, comparadas aos originais, eram de uma vacuidade assombrosa. E vejam, naquele tempo as gravadoras mandavam e desmandavam, embora comparadas às dos anos 1980 fossem tão bobinhas quanto os intérpretes. O Rock Brasil dos anos 1980 em diante, mesmo num ambiente de gravadoras muito mais multinacionais e poderosas, teve um lado de rebeldia e de “atitude” que a Jovem Guarda nunca foi capaz de sonhar. Sendo uma cópia ou transcrição do rock que se fazia fora, o Rock Brasil copiou também muitas coisas boas daquele rock. Não apenas o vigor eletrificado e a postura desafiadora, mas uma consciência crítica nas letras, uma disposição de dizer verdades incômodas, uma irreverência que, mesmo diluindo-se com frequência em mera “atitude”, produziu canções notáveis que ainda hoje são lembradas e cantadas.
Comparados aos ingênuos rapazes de franjinha e às mocinhas de minissaia da Jovem Guarda, os roqueiros dos anos 1980 fizeram rock de verdade, um similar nacional que imitou com sucesso as qualidades do original estrangeiro. Comparado a eles, a Jovem Guarda foi algo tão infantil quanto o repertório de Xuxa e Angélica.
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