Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
quarta-feira, 21 de abril de 2010
1936) Cançõezinhas de Roberto (23.5.2009)
Citei recentemente aqui dez canções que eu considero minhas 10 favoritas dos 50 anos de carreira de Roberto Carlos. O “Rei” é mais cantor do que compositor, de modo que nesses apanhados de sua obra estou registrando o que ele gravou, não apenas o que escreveu. Além de ter sido roqueiro e ser um bom autor/intérprete de canções românticas, uma coisa que faz o charme da obra de Roberto são certas cançõezinhas que talvez ele fizesse sem muita atenção e sem nenhuma pretensão. Cançõezinhas feitas de brincadeira mas que são lembranças caras a nós, os seus admiradores. Pois é, amigos, logo eu, tão exigente. Mas Roberto Carlos foi a trilha sonora de nossas vidas. Ideologias estéticas à parte, ele é parte da paisagem, é como o Pão de Açúcar, que nem precisava ser bonito para estar ao fundo de todas as fotos.
A simbiose (ou a promiscuidade) entre música popular e imprensa deu origem à canção “A Candinha”, em que RC tirava o chapéu para a fictícia redatora da coluna “Mexericos da Candinha”, ingênua precursora das revistas de fofoca de hoje em dia, que pegam pesado com todo mundo. A canção tinha versos (“A Candinha quer fazer da minha vida um inferno / já está falando do modelo do meu terno”) glosadas depois por Caetano em “Tropicália”. O clima brincalhão de algumas canções sempre atuou como um diluidor das doses de romantismo concentrado na obra de RC, e nunca ele foi tão divertido quanto em canções bobinhas como “É meu, é meu, é meu”, em que ele se declara o proprietário do corpo da amada “da sua cabeça até / a ponta do dedão do pé”, e diz: “Tudo que eu falei, meu bem / e o que eu não falei também / tudo que você pensar / é meu, é meu, é meu”.
O mesmo espírito de malícia infantil está em “Vista a roupa, meu bem”, em que ele, tentativamente, sugere que a amada está nua na cama e só depois revela, para o alívio da Família Brasileira, que os dois estão na praia. O jeitão de cantar, imitando os fox-trots de outrora, prefigura outra caricatura musical, “I love you”, em que ele faz alusão musical e poética a uma época ultrapassada: “...e eu vou vestir meu terno branco outra vez”. Eram canções em que ele começava a trocar as guitarras roqueiras por um estilo “retrô” mais de acordo com seu repertório futuro.
Músicas assim nos lembram que Roberto Carlos é geralmente visto como um roqueiro que depois se tornou um cantor romântico com tinturas religiosas. Mas o seu repertório, tanto como compositor quanto como intérprete, sempre foi mais variado do que isto, mesmo levando em conta o perfil cauteloso, conservador, politicamente correto e de “genro ideal” que ele sempre teve todo o cuidado de cultivar. Como ocorre em todas as carreiras não programadas, a de Roberto Carlos flutuou de acordo com as tendências de mercado e com os momentos da vida pessoal do artista. Mesmo suas canções ideológicas (Cristo, as baleias, etc.) têm a espontaneidade das mensagens que vêm da emoção, não do intelecto.
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