Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
quinta-feira, 15 de abril de 2010
1918) As HQs de Roberto (2.5.2009)
A Jovem Guarda, onda em que aprendi a surfar na prancha do rádio, foi um reduto de uma forma que está caindo em desuso: a canção narrativa. A canção que conta uma historinha como começo, meio e fim. Eram histórias bobas; mas uma parte do seu charme era essa ingenuidade de história em quadrinhos, de histórias de amor bobinhas, que pouco lembravam o rude mundo roqueiro de James Dean ou Marlon Brando. As letras da Jovem Guarda lembravam os quadrinhos de Marge, a criadora de Luluzinha & Bolinha. (Alguém ainda sabe tocar “A Festa do Bolinha”?)
Assim era o repertório de Roberto Carlos. “O Gênio” (“Andando um dia na rua notei / alguma coisa caída no chão...”) é a historinha divertida do cara que encontra a lâmpada de Aladim na rua, pede garotas e dinheiro, e vê o Gênio ficar com tudo para si e se instalar na sua casa. Em “Os 7 cabeludos” (“Tudo começou quando Lili foi à esquina / a turma da outra rua se empolgou com a menina...”) há uma tentativa de recriar brigas de rapazes por causa de uma garota: “Brigamos muito tempo / rasgamos nossa roupa / fugimos da polícia que já vinha feito louca”, mas são as briguinhas leves e sem consequências dos musicais de Elvis Presley.
“História de um Homem Mau” (“Eu vou contar pra todos / a história de um rapaz / que tinha há muito tempo / a fama de ser mau...”), com suas modulações ascendentes, é um faroeste que vai criando um suspense comparável ao de filmes como Matar ou Morrer ou Appaloosa. Mas a maior parte das historietas são pequenos episódios do cotidiano, como “Pega Ladrão” (“Estava com meu broto no portão / quando um grito ouvi: pega ladrão!...”). O narrador vê todo mundo perseguindo e subjugando um sujeito que roubou um coração. Sem acreditar nisso, ele interfere: “Não pode um coração alguém roubar!” Aproveitando a distração, o ladrão volta a fugir, e ele fica sabendo “que o tal coração / era uma jóia pendurada num cordão”.
Automóveis eram um dos temas preferidos de Roberto, tema que lhe deu clássicos desde “O Calhambeque” até “As curvas da estrada de Santos”. Um dos meus preferidos nesta linha é “Parei na contramão”: “Vinha voando no meu carro quando vi pela frente / na beira da calçada um broto diferente / joguei o pisca-pisca para a esquerda e entrei / a velocidade que eu vinha, não sei / pisei no freio obedecendo ao coração e parei – parei na contramão...” Ele buzina para a moça, e a buzina não funciona. O guarda cai em cima e lhe aplica uma multa. Ele vai embora sem ver mais o broto, mas diz que da próxima vez “a buzina vai funcionar”. No show, isso era pretexto para uma buzinaria vocal ensurdecedora: “bibí... bibí...”
E não esqueçamos a ficção científica de “O Astronauta”, em que ele diz que prefere “desligar os controles da nave espacial / para ficar para sempre no espaço sideral...” As canções-HQ de Roberto são o retrato mais inocente de um tempo épico, trágico, o ponto de mutação em que, para o bem e para o mal, o Brasil virou outro Brasil.
Também gosto dessas músicas narrativas do RC; além das citadas, recordo também da bem-humorada "O Sósia". Excelente!
ResponderExcluir