domingo, 4 de abril de 2010

1862) Salve-se quem puder (26.2.2009)




Num texto que vi citado na Internet (mais precisamente em um mailing do “A Word a Day”), os autores Robert M. Lilienfeld e William L. Rathje dizem: “Existe um mito: o de que devemos salvar a Terra. Sejamos francos, a Terra não precisa ser salva. A Natureza nem liga se os seres humanos estão aqui ou não. O planeta vem sobrevivendo a mudanças cataclísmicas e catastróficas há milhões de anos. Ao longo desse tempo, crêem os cientistas, 99% de todas as espécies já existentes surgiram e desapareceram, enquanto o planeta permaneceu. Quando falamos em salvar o meio ambiente trata-se na verdade de salvar o nosso meio ambiente – tornando-o seguro para nós mesmos, para os nossos filhos, e para o mundo como o conhecemos. Se mais pessoas vissem o problema como uma questão de salvar a si mesmas, provavelmente poderíamos aumentar a sua motivação e sua dedicação a lutar por essa causa”.

Dias atrás fui a um bar que distribuía nas mesas um artigo de jornal onde o cronista alertava os boêmios para um terrível perigo iminente: o aumento do preço da cerveja. Explicava ele que a cerveja é feita de lúpulo, cevada e outros grãos. O preço desses grãos (e consequentemente da bebida) tem aumentado sem parar nos últimos anos, porque a terra de cultivo destinada a eles está sendo tomada por plantações de cana-de-açúcar. O objetivo dessas plantações é produzir um combustível mais barato que o petróleo. O petróleo do mundo está acabando porque gastamos muita energia.

Qual a solução, então? – pergunta o cronista. E responde: economizar energia, apagar as luzes de casa, poupar gasolina, não andar com o carro muito pesado, usar judiciosamente o chuveiro elétrico no inverno e o ar condicionado no verão, etc. etc. Os dois terços restantes da crônica são um conjunto de medidas simples e eficazes para se economizar energia. E tudo isto para quê? para que o preço da cerveja caia, e a gente possa beber mais cerveja.

Esses dois exemplos mostram a irracionalidade básica do ser humano, e mostram que somente levando essa irracionalidade em conta é possível convencer as pessoas a fazerem o que queremos, desde enviá-las para uma guerra onde certamente morrerão até convencê-las a salvar a própria vida. Parece que temos um comando embutido em nossa mente que nos torna incapazes de perceber o alcance a longo prazo de tudo que fazemos. Percebemos apenas o nosso interesse egoísta, imediato, auto-indulgente. E somente apelando para esse interesse é possível nos levar a agir em função de algo mais amplo.

Campanhas do governo poderiam adotar esse tipo de ótica: distribuir instruções práticas e úteis, só que camufladas por um propósito que falasse mais de perto ao egocentrismo, à vaidade, ou a alguma outra tendência capaz de mobilizar as pessoas a “lutarem pelos seus próprios interesses pessoais”. Parece que é muito mais fácil do que tentar convencê-las a lutar por um interesse coletivo pelo qual elas não ligam a mínima.




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