quinta-feira, 26 de novembro de 2009

1380) A Idade da Ignorância (16.8.2007)





(C. P. Snow)

O jornal “The Observer” convidou três escritores, três cientistas e dois apresentadores de TV para responderem perguntas básicas sobre ciência. A intenção era dar um balanço de como andam os nossos conhecimentos gerais. 

As perguntas são relativamente simples, mas para meu enorme embaraço percebi que não sabia as respostas certas para a maioria delas. Aliás, não só eu. A maioria dos entrevistados também. 

As perguntas eram: Por que o sal se dissolve na água? Qual a idade da Terra? O que acontece quando você acende uma lâmpada? Um clone é o mesmo que um gêmeo? Por que o céu é azul? Qual é a Segunda Lei da Termodinâmica? Eu acertei duas, mas não direi quais.

O jornal propunha um debate – que já vem rolando há décadas – sobre a divisão do mundo ocidental em duas culturas, uma humanista e artística, e outra científica e tecnológica. Em geral, quem faz parte de uma ignora e desdenha a outra. 

Essa denúncia foi feita pelo britânico C. P. Snow em seu livro As Duas Culturas e a Revolução Científica (1959). Snow combatia a ignorância científica dos intelectuais britânicos de sua época.

Dizia ele: “Muitas vezes compareço a reuniões de pessoas que, pelos critérios tradicionais, são consideradas muito cultas, e que se espantam com a falta de cultura dos cientistas. Uma ou duas vezes, reagindo a provocações, eu lhes perguntei o que eles sabiam a respeito da Segunda Lei da Termodinâmica, ou a Lei da Entropia. A resposta sempre foi fria, e negativa. E na verdade eu estava perguntando o equivalente científico a: Vocês já leram alguma obra de Shakespeare?” 

Neste ponto, os grandes cientistas saem ganhando – todos eles demonstram uma grande amplitude de leituras e de apreciação artística (música, pintura, etc.).

A certa altura da vida, todo indivíduo bem sucedido social e financeiramente acha que o que sabe já dá pro gasto, e que não precisa aprender mais nada. E no entanto se saíssemos fazendo perguntas desse tipo por aí, teríamos um retrato patético do que são nossos “intelectuais”. 

Não me refiro a ir fazer esse tipo de pergunta no metrô ou na calçada. Bastaria fazê-las nas Academias literárias, nas redações de jornais, no Congresso Nacional, nos Conselhos Universitários. Cada um só sabe as coisas do seu ofício – e olhe lá!

No meu livro O que é ficção científica (1986) citei uma frase de Arthur C. Clarke: “Uma pessoa que conheça tudo sobre as comédias de Aristófanes e nada sobre a Segunda Lei da Termodinâmica é tão inculta quanto aquela que dominou a teoria quântica mas pensa que Van Gogh pintou a Capela Sistina”. 

Nosso conhecimento do mundo será sempre imperfeito e deformado. É ilusão pensar que alguém, em algum momento, já entendeu o que é o mundo. Aristóteles, Hegel, Einstein, Marx, Freud... cada um deles descreveu uma unha do pé do elefante, e olhe lá. Mas isto não é razão para que a gente esnobe quem procura estudar o elefante, nem para que a gente se recuse a admitir que o elefante existe.





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