quarta-feira, 13 de maio de 2009

1021) Matemática e Estética (24.6.2006)



A Ed. José Olympio relançou a Iniciação à Estética de Ariano Suassuna, um volume despretensioso e utilíssimo em que o autor “dá uma geral” nas principais teorias da Estética, de Platão e Aristóteles até Hegel e Bergson. Mesmo lidando com uma matéria tão rarefeita, Suassuna evita o jargão e mantém o discurso num tal nível de acessibilidade que até eu, que tenho uma formação filosófica da ordem do zero-vírgula, fico com a sensação de ter entendido uma porção de coisas. Pois já dizia Ortega y Gasset: “A clareza é a cortesia do filósofo”.

Alguém dotado da mesma clareza devia escrever um livro intitulado “Iniciação à Estética da Ciência”. Discutem-se os aspectos estéticos das obras de Arte (as quais, é claro, têm outros aspectos além deste: aspecto social, político, comercial, etc.) e ninguém fala no lado estético da Ciência no que tem de mais criativo. O excelente livro A Experiência Matemática de Philip J. Davis e Reuben Hersh tem um capítulo intitulado “A componente estética”, que abre com uma admissão explícita, por parte de Aristóteles, de que todos os elementos que caracterizam o Belo na Arte também estão presentes nas ciências matemáticas. Reuben e Hersh lamentam a pouca discussão formal destes aspectos, embora eles façam parte da atividade teórica e prática dos matemáticos, e os comparam aos móveis coloniais norte-americanos: não existe nenhuma codificação teórica do seu estilo, não obstante eles seguiam uma tradição estética passada de pessoa para pessoa.

Dizem eles: “Têm sido feitas tentativas para decompor a estética matemática em suas componentes – alternâncias de tensão e repouso, expectativas alcançadas, a surpresa de perceber relações insuspeitadas e unidades, prazer visual sensual, prazer na justaposição do simples e do complexo, da liberdade e das existências, e, naturalmente, nos elementos familiares da arte, harmonia, equilíbrio, contraste, etc.” Pode-se distinguir a existência de aspectos estáticos e dinâmicos na Matemática. Quando Reuben & Hersh usam termos como “expectativa”, “surpresa”, “alternâncias de tensão e repouso”, claramente estão considerando a Matemática como um processo que se desenrola no Tempo (como seriam na arte o teatro ou a música) e não simplesmente um objeto estático que pode fornecer uma impressão instantânea (como uma escultura ou uma pintura), ainda que um exame mais prolongado possa revelar novos detalhes ou novas relações.

Não podemos mostrar um segundo de uma sinfonia ou de uma canção, para dar uma idéia do que é a obra. A música ocorre no Tempo, e é impossível apreendê-la num relance. Por outro lado, uma pintura possui uma “totalidade instantânea”. Podemos apreender num vislumbre o conjunto da obra, mesmo que seja o teto da Capela Sistina. Eu imagino que certas fórmulas matemáticas, como E=mc2, têm essa beleza instantânea, mesmo que para apreender essa beleza exista um processo subentendido, processo que precisa ser esmiuçado ao longo do tempo.

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