sábado, 14 de março de 2009

0881) Um primo mais distante (12.1.2006)



Talvez você não lembre, caro leitor, mas afinal, aqui nesta coluna só quem tem obrigação de lembrar sou eu. Em 21.12.2003 comentei aqui a descoberta do maior número primo (até então). Descobrir o “último número primo”, o maior de todos, é impossível, pois já foi provado que eles são uma série infinita. O grande lance é descobrir o próximo número primo, a partir do maior já conhecido, mas o problema é que esse próximo número parece cada vez mais distante, e descobri-lo requer sempre o uso de milhares de computadores interligados, rodando o mesmo programa. Estes números são expressos na forma de 2 elevado a uma potência enorme, menos 1. São conhecidos como “Primos de Mersenne”, em homenagem ao matemático francês que teorizou sobre eles há três séculos. Se você só lê português mas é cobra em matemática, pule aqui: http://www.mat.puc-rio.br/~nicolau/papers/mersenne/mersenne.html.

O número descoberto agora é o 43o. primo de Mersenne. Andei comendo mosca, porque o que noticiei em 2003 era o de número 40. Não faz muita diferença, até porque se eu visse ambos escritos lado a lado não conseguiria distingui-los. O de 2003 era um número com mais de 6 milhões e 300 mil dígitos; este novo, recém-saído do forno, tem exatos 9.152.052. Como o “Jornal da Paraíba” iria gastar muito papel e tinta para transcrevê-lo por inteiro, podemos recorrer à útil fórmula mersenniana: 2 elevado à 30.402.457a potência, menos 1. Há um prêmio de 100 mil dólares, oferecido pela Electronic Frontier Foundation, para a equipe que descobrir um Primo de Mersenne com mais de 10 milhões de dígitos. Tudo indica que será a turma do Projeto GIMPS (Great Internet Mersenne Prime Search), que descobriu os nove mais recentes: http://www.mersenne.org/prime.htm.

A utilidade disto tudo? Não sei, assim como não sei a utilidade de escrever sinfonias ou pintar paisagens. Acho que nos dá a sensação de estar tocando na medula da beleza universal, e em alguma lei não-escrita na fronteira entre a Ordem e o Caos do Universo. Em seu livro A Experiência Matemática Philip Davis e Reuben Hersh comentam que os números primos parecem se distribuir irregularmente ao longo da série dos números inteiros. Seu aparecimento é imprevisível, daí ser necessária toda essa gigantesca checagem, número por número, para saber se o próximo número inteiro é primo ou não. David & Hersh observam que na lista dos números primos notamos “a falta de qualquer tipo detectável de ordem ou de regularidade”. Por exemplo: nos 100 números inteiros entre 9.999.900 e 10 milhões existem nove números primos; mas nos 100 inteiros seguintes só existem dois. Por quê?

Minha teoria pessoal é de que os primos são os únicos números verdadeiros, de existência puramente matemática. São irredutíveis como os elementos químicos. Os tijolos básicos de uma matemática pura, pura Linguagem, não contaminada pela natureza física, pelo mundo das coisas contáveis.

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