A imaginação parece criar coisas do nada, como um mágico que enfia a mão na cartola sem saber o que vai sair dali. Tanto pode sair um coelho cor-de-cenoura mastigando um catálogo telefônico quanto um pão francês com uma chave inglesa dentro.
Onde estavam estas imagens, antes do instante em que eu pensei nelas? Não estavam em lugar nenhum: foram conjuradas por um esforço meu, pela conexão inesperada (e que eu nunca fiz em minha vida, até alguns segundos atrás) entre conjuntos de sinapses no interior de meu cérebro, conjuntos de reações químicas que envolvem os padrões verbais e visuais relativos ao elementos evocados ao acaso (“mágico”, cartola”, “coelho”, etc.).
A escritora americana Audrey Niffenegger (autora do elogiado The Time Traveller’s Wife) diz num artigo recente:
“De onde vêm as idéias? As minhas tendem a brotar do nada. Num instante, estou tentando lembrar onde deixei minhas chaves. No minuto seguinte estou pensando numa menininha chamada Lizzie, cujo rosto é todo coberto por pelos negros e macios. Ela não estava em minha mente um instante atrás; de onde terá vindo? De algum salão muito amplo, cheio de idéias, penso eu. Imagino Lizzie esperando pacientemente, segurando uma senha onde há um número, esperando seu número ser chamado. Talvez esteja esperando ali há anos. Agora chegou sua vez. Ele se levanta, pronta para pular para dentro de minha mente, com a esperança de que tudo dê certo”.
Pessoas diferentes têm a imaginação desencadeada por processos diferentes, com ênfase naquilo que fazem de maneira mais espontânea.
Algumas pessoas pensam por associação de idéias; outras, por associação sonora de palavras; outras, por associação visual de imagens.
Um exercício que faço com freqüência é pegar meio ao acaso um álbum de fotografias ou de pinturas, olhar para uma delas, e fazer de conta que estou vendo um filme. Que lugar é aquele? Quem são aquelas pessoas, o que estão fazendo ali, o que estão pensando naquele exato momento, que história está acontecendo com elas?
Se você se concentrar, os personagens vão brotando, as histórias vão brotando. O poeta Wallace Stevens disse: “A imaginação é como a luz: ela não adiciona nada além de si mesma”. Ou seja, tudo já estava de alguma forma em nossa mente, naquele galpão às escuras. A imaginação é o facho de lanterna que o percorre e revela o que está amontoado lá dentro.
Outra metáfora útil é pensar na imaginação como o primeiro momento de contato entre dois elementos da memória que nunca haviam sido conectados antes. Se eu penso num cangaceiro empunhando uma pistola, esta imagem pertence à memória; já a vi. Mas se penso num cangaceiro empunhando uma enceradeira, acho que criei uma ligação eletroquímica em meu cérebro ligando estes dois conjuntos de registros, “cangaceiro” e “enceradeira”.
Imaginar é produzir novas conexões, novos atalhos, novas passagens. É um jogo de “ligar os pontos”, sendo que os pontos são fornecidos pelos sentidos.
Especialmente acessível ao entendimento, parabéns!
ResponderExcluir