Vejam só o imenso descaso que os jovens têm com o passado. Você está andando com um filho ou sobrinho de 10 anos de idade, aí chega numa esquina, aponta e diz: “Tá vendo ali, onde tem aquele edifício? Antigamente era um boteco ótimo, onde eu vinha com meus amigos!” E o diabo do guri não dá a mínima, parece achar que esse fato não tem a menor importância. De nada adianta percorrer com ele o centro de Campina Grande e evocar os espectros da História, ele não tá nem aí. “Olhe, ali naquela esquina ficava o Mercadinho Bandeirante... Antigamente aqui nas calçadas tinha as barraquinhas de mate: com leite, com limão e com maçã... Aqui era a Livro-7, uma livraria ótima... A fachada do Alfredo Dantas tinha uns janelões enormes, e dois leões de pedra no portão de entrada...” O debilóide masca o chiclete, dá de ombros e profere a mais terrível pá-de-cal da língua portuguesa: “E daí?”
Jovem não está interessado no Passado. Nem no Futuro, pra ser sincero. Ele mal acabou de chegar, e o Presente cai sobre ele com a força irresistível da sensorialidade, da imediaticidade, da Presença. O Instante assalta os seus cinco sentidos, berra, agarra, relampeja. Algumas culturas “primitivas” têm uma organização do Tempo diferente da nossa. Possuem dois tempos apenas: o Presente, ou seja, aquilo que está acontecendo externamente, e um outro tempo que acontece apenas na nossa mente. Os jovens têm apenas um tempo: o Presente.
Alguém já disse que quando nascemos nossa mente tem dois galpões imensos, gigantescos. Um deles, o Passado, começa vazio; o outro, o Futuro, começa cheio. E durante a vida inteira não fazemos outra coisa senão transportar cargas, pacotes, caixotes, sacolas, de um para o outro, até o dia em que o Futuro está vazio e o Passado cheio. Eu diria que os jovens não dão importância ao Passado porque nunca viram nada passar. Muitas vezes têm essa experiência de um modo traumático: morte dos avós ou dos pais. Minha noção pessoal do passado na infância, por exemplo, está muito marcada por mudanças de endereço. Meus pais se mudavam muito quando eu era pequeno; até se fixarem no Alto Branco em 1961, lembro de ter morado numas seis casas diferentes, e a recordação visual de cada uma delas é muito nítida. O Passado não se confundia com o presente. Com 8 anos de idade, eu já sabia o que era ter saudade.
O jovem só vai se preocupar com o passado quando perceber que certas coisas passaram a existir somente em sua memória. Ele aprenderá a oscilar entre a sabedoria de Capinam (“As coisas passam, e eu quero é passar com elas”) e a de Dimas Batista (“Tudo passa, na vida tudo passa, mas nem tudo que passa a gente esquece”). Quando ele vir que as coisas estão morrendo à sua volta, ele sentirá a sua própria morte fechando o cerco, aproximando-se de todas as direções ao mesmo tempo; e isto não lhe dará medo, e sim um entendimento mais profundo de como o mundo funciona, e de quem ele é de verdade.
Clap, clap, clap!
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