(José Sanz e Arthur C. Clarke em 1969)
Espero não morrer sem escrever um perfil biográfico do editor e tradutor José Sanz, falecido em 1987, um dos sujeitos mais fascinantes que conheci. Já o homenageei num dos contos do meu livro Mundo Fantasmo, mas aquele personagem é uma colagem de fatos e invenção.
O que eu gostaria mesmo é de manusear os documentos que Sanz deve ter deixado espalhados por aí, e tentar reconstituir algo de sua vida real, que foi, muito mais do que meu conto, uma colagem de fatos e invenção.
José Sanz foi jornalista, mas é mais conhecido como entusiasta do Cinema Novo brasileiro e da literatura de ficção científica; duas religiões laicas que nos aproximaram desde o nosso primeiro encontro.
Eu ia passando pela livraria Dazibao, em Ipanema, e o vi lá dentro. Entrei, e na cara de pau me apresentei: “Sanz, eu sou o cara que escreveu o livro sobre FC na Coleção Primeiros Passos”. Abraçou-me como se eu fosse um filho pródigo que ele procurava há anos, e conversamos até a Livraria fechar.
Tivemos outros encontros no mesmo lugar (ele morava ali pertinho), nos telefonávamos de vez em quando, e quando o câncer começou a fazer sua investida final ainda o visitei algumas vezes no Hospital da Beneficência, acompanhado por amigos do Clube de Leitores de Ficção Científica.
Sanz traduziu dezenas de livros de FC (sua tradução de Solaris foi republicada há pouco pela Relume-Dumará), conheceu pessoalmente dezenas de autores, e trouxe muitos deles para um Simpósio de FC que organizou no Rio em 1968.
Como crítico de cinema, tinha uma frase famosa: “Cinema não se discute, faz-se” – frase que nunca o impediu de falar sobre o assunto durante tardes inteiras.
Quando morreu, Rogério Sganzerla mandou ao “JB” uma extensa carta onde queixava-se, com amargura, de que um tal vulcão de idéias e de atividade (Sganzerla o chamava afetuosamente de “Sanz Fiction”) ficasse desaproveitado.
Não era rico, e parece-me que sempre viveu “de bicos”. Na verdade, nosso primeiro encontro se deu muito antes daquele. De passagem pelo Rio, fui à Livraria do Pasquim para deixar um livro meu em consignação, e tremi na base ao reconhecer o velhinho de barbas brancas e irascíveis que preenchia a nota. Não me apresentei, não falei que era seu fã. Mais do que tímido sou orgulhoso, só gosto de falar com alguém quando posso fazê-lo de igual para igual.
Sanz mentia mais do que cigano; contava histórias mirabolantes sobre condessas que namorou na Europa, farras que fez com Arthur C. Clarke ou Brian Aldiss, escaramuças com a polícia numa cidade obscura na Europa Central. Tudo que contava era vívido, interessante, e a coisa que menos importava era se tinha acontecido ou não.
O mundo em que viveu era um mundo virtual, feito de ficção, filmes, romances futuristas, sonhos, aventuras, revoluções; noites de vinho, música, mulheres e conversa interminável sob as estrelas de um céu estrangeiro. Tomara que o Céu seja assim, e que Sanz nem tenha percebido a transição.
ano passado, em São Paulo, teve um encontro de ficção científica na biblioteca pública Viriato Correa e ple primeira vez descobri sobre este encontro de ficção científica que teve dentro de um festival de cinema do Rio.Nunca imaginei que tantos famosos autores de FC estiveram aqui no Brasil !!!
ResponderExcluirpetermihajlovic@ig.com.br
Isso mesmo. Procure na Bib. Viriato Correa o livro "Simpósio FC" que conta a história desse encontro e transcreve as palestras (todas muito boas) dos autores.
ResponderExcluirHoje conversando com um amigo, o Andre Faria, sobre "mentirosos", falou que no Rio dos anos 60 existia o "Sanz", que contava histórias incríveis, nas quais ninguém acreditava, mas que ele acredita serem reais. Poucas vezes vi ele falar com tanto entusiasmo sobre alguma das grandes figuras com as quais ele conviveu na época que morava no Rio!
ResponderExcluirNão resisti e vim para o Google, encontrando esse texto, fiquei mais curioso sobre quem foi o "Sanz".
O perfil biográfico, foi escrito?
Como disse o Faria: "esse merece até um filme!" rsrs
Valdemar, há um conto de Fernando Sabino inspirado nas mentiras de Sanz, acho que o título é "Sardinhas do Báltico". Deve estar no livro "A mulher do vizinho", ou talvez em "O homem nu". Registre-se também que as mentiras dele não produziam dano a quem quer que fosse. Eram histórias fantasiosas, contada para divertir.
ResponderExcluirObrigado Braulio, vou procurar.
ResponderExcluirE sim, as mentiras do Sanz eram puro entretenimento, e pelo o que estou vendo, de boa qualidade! rsrsrs
Convivi intensamente com ele de 1973 até sua morte. Foi meu mentor na literatura e grande amigo. Nossa imensa diferença de idade, mais de 40 anos nunca foi impedimento para uma relação rica e afetuosa. O convívio se estendeu à minha família e amigos. Tarde inteiras passadas nas livrarias que trabalhou e outras tantas dentro de cinemas e concertos. Foi um dos meus "pais'. Suas mentiras não eram mentiras exatamente. Eram " adaptacoes" de coisas acontecidas com ele e com outros. Herdei grande parte de sua biblioteca, ainda em vida. Saudades muitas!
ResponderExcluirConvivi intensamente com ele de 1973 até sua morte. Foi meu mentor na literatura e grande amigo. Nossa imensa diferença de idade, mais de 40 anos nunca foi impedimento para uma relação rica e afetuosa. O convívio se estendeu à minha família e amigos. Tardes inteiras passadas nas livrarias que trabalhou e outras tantas dentro de cinemas e concertos. Foi um dos meus "pais'. Suas mentiras não eram mentiras exatamente. Eram " adaptacoes" de coisas acontecidas com ele e com outros. Herdei grande parte de sua biblioteca, ainda em vida. Saudades muitas!
ResponderExcluirBráulio. Estive uma vez com Sanz numa livraria que acho que foi essa mesma mencionada por você. Eu estava acompanhando de Moacy Cirne. MUIto simpático e conversador que só ele. Ao falar de Welles (provocado por Moacy, creio), revelou que foi o próprio Welles que dirigiu toda a sequência em que este aparece no filme Moby Dick, à revelia de Huston. Mais uma de suas patranhas, provavelmente. Mas já o conhecia de nome, sobretudo pela fama de se dizer amigo íntimo do gênio de Cidadão Kane. Bem que gostaria de tê-lo conhecido melhor. Um abraço.
ResponderExcluirFrancisco Sobreira