Certa vez o imperador Julio César passou um tempo fora, invadindo países alheios, e ao voltar para Roma soube que sua esposa tinha dado uma festinha em casa, ou convidado um amigo para um jantar a dois, algo assim. Nada demais, mas ele pediu-lhe que não fizesse de novo.
Ela disse: “Ave, César! Estareis por acaso imaginando que não sou uma esposa honesta?!” E ele, político veterano, explicou: “Minha filha, a mulher de César não precisa apenas ser honesta: ela precisa também parecer honesta”.
César sabia que a população nunca tem acesso à verdade, e sim às versões. Como não presencia os fatos acontecidos, fica conhecendo apenas o que se conta deles. Portanto, não basta fazer o que é certo, é preciso produzir versões que convençam as pessoas de que não se fez o errado.
Uma vez li uma matéria sobre indústria fonográfica, e soube que na fabricação de discos de vinil era preciso colocar tinta preta na matéria-prima, para que os LPs ficassem pretos. Por que? Porque no começo da indústria os discos eram feitos com matéria-prima preta, inclusive cera de carnaúba. Todo mundo se acostumou. Quando o vinil, que é transparente, foi introduzido, era preciso pintar os discos de preto para que o consumidor continuasse confiando no produto. Mas nada, afora isto, obrigava um LP a ser preto. Para quem se lembra, os disquinhos “compactos” infantis eram coloridos, Zé Ramalho fez um disco verde, Egberto Gismonti fez um disco branco, e assim por diante.
Não basta um produto ser autêntico, ele tem que parecer autêntico. Aqui no Rio, a via expressa chamada de Linha Vermelha é ladeada por uma longa estrutura de vigas metálicas, quando cruza os bairros de Bonsucesso e São Cristóvão. As vigas são cinza, mas quando cruzam a Avenida Brasil, a via mais movimentada do Rio, elas aparecem pintadas de vermelho. Para quê? Para que todo mundo saiba que aquela é a “Linha Vermelha”. É um nome que vem da cor do traçado na planta urbanística original, que levou décadas para sair do papel, e se todo mundo se acostumou a chamar de “Linha Vermelha” ela não pode ser cinza.
Este mecanismo de “não só ser, mas parecer”, é um dos ingredientes que geram, por exemplo, os clichês étnicos. Um baiano louro e de olhos azuis pode ter nascido em Salvador, de família tradicional local, mas “não parece baiano”. Aqui no Rio, todo mundo diz que eu “não pareço nordestino”, porque sou branquelo. Fora do Brasil, “não pareço brasileiro”, pela mesma razão.
Dias atrás, quando o Treze derrotou o Coritiba pela Copa do Brasil (dá-lhe, Galô!), o “Globo Esporte” mostrou a comemoração da torcida e... um grupo de forró. Que relação tinha o forró com a vitória do Treze? Para mim, muito pouca. Mas jornalistas e público são grupos que se condicionam mutuamente. Se a matéria mostra a Paraíba, tem que ter forró, se não “não parece que foi na Paraíba”. Devia haver uma cadeira nas faculdades de Jornalismo só para estudar durante um semestre este fenômeno.
Ela disse: “Ave, César! Estareis por acaso imaginando que não sou uma esposa honesta?!” E ele, político veterano, explicou: “Minha filha, a mulher de César não precisa apenas ser honesta: ela precisa também parecer honesta”.
César sabia que a população nunca tem acesso à verdade, e sim às versões. Como não presencia os fatos acontecidos, fica conhecendo apenas o que se conta deles. Portanto, não basta fazer o que é certo, é preciso produzir versões que convençam as pessoas de que não se fez o errado.
Uma vez li uma matéria sobre indústria fonográfica, e soube que na fabricação de discos de vinil era preciso colocar tinta preta na matéria-prima, para que os LPs ficassem pretos. Por que? Porque no começo da indústria os discos eram feitos com matéria-prima preta, inclusive cera de carnaúba. Todo mundo se acostumou. Quando o vinil, que é transparente, foi introduzido, era preciso pintar os discos de preto para que o consumidor continuasse confiando no produto. Mas nada, afora isto, obrigava um LP a ser preto. Para quem se lembra, os disquinhos “compactos” infantis eram coloridos, Zé Ramalho fez um disco verde, Egberto Gismonti fez um disco branco, e assim por diante.
Não basta um produto ser autêntico, ele tem que parecer autêntico. Aqui no Rio, a via expressa chamada de Linha Vermelha é ladeada por uma longa estrutura de vigas metálicas, quando cruza os bairros de Bonsucesso e São Cristóvão. As vigas são cinza, mas quando cruzam a Avenida Brasil, a via mais movimentada do Rio, elas aparecem pintadas de vermelho. Para quê? Para que todo mundo saiba que aquela é a “Linha Vermelha”. É um nome que vem da cor do traçado na planta urbanística original, que levou décadas para sair do papel, e se todo mundo se acostumou a chamar de “Linha Vermelha” ela não pode ser cinza.
Este mecanismo de “não só ser, mas parecer”, é um dos ingredientes que geram, por exemplo, os clichês étnicos. Um baiano louro e de olhos azuis pode ter nascido em Salvador, de família tradicional local, mas “não parece baiano”. Aqui no Rio, todo mundo diz que eu “não pareço nordestino”, porque sou branquelo. Fora do Brasil, “não pareço brasileiro”, pela mesma razão.
Dias atrás, quando o Treze derrotou o Coritiba pela Copa do Brasil (dá-lhe, Galô!), o “Globo Esporte” mostrou a comemoração da torcida e... um grupo de forró. Que relação tinha o forró com a vitória do Treze? Para mim, muito pouca. Mas jornalistas e público são grupos que se condicionam mutuamente. Se a matéria mostra a Paraíba, tem que ter forró, se não “não parece que foi na Paraíba”. Devia haver uma cadeira nas faculdades de Jornalismo só para estudar durante um semestre este fenômeno.
Vermelho... compreende-se, não?
ResponderExcluirBelo lugar, aqui.
:)