domingo, 13 de julho de 2008

0443) No Olimpo da arrogância (20.8.2004)



Escrevo estas linhas na terça-feira passada, dia 17, e os Jogos de Atenas já mostraram algumas cenas memoráveis. O Brasil já ganhou dois bronzes no judô, e no vôlei travou uma batalha memorável com a Itália (33 x 31 no “tie-break”). Vi a pernambucana Joana Maranhão arrasando na piscina, vi Guga sofrendo na quadra, vi nosso futebol feminino matando de inveja o masculino, vi o basquete de Porto Rico derrotar o Dream Team americano.

O que me traz ao assunto principal: a arrogância dos americanos. Já comentei nesta coluna que poucas pessoas são tão americanizadas quanto eu, mas é duro agüentar o marketing, a pose, a marra, o desprezo-pelo-mundo que passa nas atitudes de muitos atletas dos EUA. Vai daí que ninguém torceu tanto quanto eu para que o truculento Michael Phelps não conseguisse ganhar as 8 medalhas de ouro que prometeu. (Até agora ganhou 2 e perdeu 2) O basquete já tomou sua sapecadazinha, e o futebol tem-com-que-me-pague daqui pro fim. E hoje de tarde, paradoxalmente, vi a derrota da única equipe americana que não me incomodaria de ver ganhar: a da ginástica feminina. Todas aquelas meninas, não importa o país, me parecem igualmente frágeis e fortes, intensamente físicas e misteriosamente etéreas. Ganharam o ouro as romenas. Menos mal.

Quando falo na arrogância, não é preconceito nacionalista. Uma das grandes qualidades do povo americano é a sensatez, a simplicidade, os pés-no-chão. É o dinheiro que está acabando com isso. Mas há quem mantenha os olhos abertos. Dan Wetzel, comentarista de esportes do Yahoo, pergunta: “Afinal, quem inventou essa história de Phelps ganhar 8 medalhas de ouro? Foi ele mesmo, num rompante de audácia juvenil, que pensou: ´Por que não sugerir o impossível´? Foi sua equipe de marketing no Octagon Group, ansiosa para ganhar a guerra da mídia? Foi a USA Swimming, desesperada por atenção, e vendo nisto uma bela chance? Foi a Speedo, cuja equipe de relações públicas faturou um milhão de dólares em publicidade gratuita ao oferecer um milhão a Phelps, se ele conseguisse?”

Vinte anos atrás, em plena Guerra Fria, o espírito olímpico transformou-se numa guerra particular entre comunistas e capitalistas, com boicotes, perseguições e acusações de parte a parte. Tivemos olimpíadas sucessivas sem os melhores atletas do mundo, só porque se realizavam “em território inimigo”. Depois que a URSS caiu de podre, quem tomou conta foi o espírito do marketing comercial, de badalação, de mercado onipotente, de vitória a qualquer custo. Sem um adversário específico à altura, os americanos assumiram uma postura imperial, de insuportável arrogância. Wetzel lembra o slogan da Nike para os Jogos de Sidney: “Você não ganha a prata. Você perde o ouro”. É essa a mentalidade esportiva que se quer passar para a garotada em volta das quadras, dos campos, das piscinas. A prata e o bronze são um símbolo de derrota, num mundo dominado por marqueteiros que nunca praticaram esporte.

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