(capa de Nadir, de Ricardo Soares)
Uma das maiores contradições de quem quer fazer o Bem é a aparente impossibilidade de fazer um Bem que seja puro, sem nenhuma dosezinha de Mal. Parece que não existe esta fórmula. Um ditado antigo diz: “Se queres a paz, prepara-te para a guerra.” Um jagunço sertanejo costumava dizer: “Eu detesto brigar. Quando um cara me chama pra briga eu mato ele bem rapidinho, só pra não ter que brigar.” Tudo isto me vem à mente ao ver o Diário da Motocicleta de Walter Salles e pensar no que terá transformado aquele rapaz idealista do filme no Che Guevara que liderou guerras de guerrilhas em Cuba e outros países, e que certamente matou muita gente pelo meio o caminho.
Será que não tem outro jeito? Será que contra um inimigo armado é obrigatório usar armas, será que contra um inimigo desleal é preciso ser desleal, será que contra um inimigo que não recua diante de nenhuma sordidez é preciso não recuar também diante de nenhuma sordidez? Só assim, em igualdade de condições, teremos alguma chance de derrotá-lo? Lembro de uma frase de Sartre em algum do volumes de Situations (cito de memória): “Quando enfrentamos um inimigo numa luta de vida ou morte, quando uma barreira de fogo o separa de nós, é preciso considerá-lo como a própria encarnação do Mal, senão não teremos chance de derrotá-lo”. Essa retórica guerrilheira foi largamente capitalizada pela direita, principalmente nos EUA, onde ser marxista era sinônimo de ser comedor-de-criancinhas.
Esta ética cruel, no entanto, não tem nada a ver com esquerda ou direita, com capitalismo ou comunismo. A guerra tem uma ética (ou anti-ética) própria que prescinde de ideologias. Todo ato intencional de matar é um assassinato, não importa se se trata de legítima defesa, de um carrasco executando um condenado em nome do Estado, ou de um soldado matando um inimigo em nome da Liberdade e da Democracia. Quem vai à guerra é para matar. É a ética do crime, a ética da briga de rua. Recordo a descrição impecável de Ricardo Soares em seu romance Nadir (Campina Grande, 1975): “Pirajibe sempre imaginara que um dia haveria de enfrentar o João Cláudio. Seu último sucesso, numa briga, remontava aos quinze anos. Depois é que aprendeu, em teoria, que, ao enfrentar um homem, deveria colocar o medo de matar ou de ferir gravemente de lado. Brigar pra valer. Nada de avaliar conseqüências, pois isto, já sendo um medo, derrotá-lo-ia de saída. Foi o que procurou pensar quando enfrentou João Cláudio. Sabia que ele era ágil, feroz e criminoso. Fez-se criminoso, feroz e ágil.”
Será mesmo preciso igualar-se ao inimigo, para ter alguma chance de derrotá-lo? Será que só é possível chegar a Poder e manter o Poder fazendo o jogo sujo do Poder? Brecht dizia que para mudar o mundo a gente não devia recusar-se nem mesmo a se aliar ao carrasco. O problema é que tem cada vez mais gente se aliando aos carrascos, e o mundo não muda nem a pau.
Será que não tem outro jeito? Será que contra um inimigo armado é obrigatório usar armas, será que contra um inimigo desleal é preciso ser desleal, será que contra um inimigo que não recua diante de nenhuma sordidez é preciso não recuar também diante de nenhuma sordidez? Só assim, em igualdade de condições, teremos alguma chance de derrotá-lo? Lembro de uma frase de Sartre em algum do volumes de Situations (cito de memória): “Quando enfrentamos um inimigo numa luta de vida ou morte, quando uma barreira de fogo o separa de nós, é preciso considerá-lo como a própria encarnação do Mal, senão não teremos chance de derrotá-lo”. Essa retórica guerrilheira foi largamente capitalizada pela direita, principalmente nos EUA, onde ser marxista era sinônimo de ser comedor-de-criancinhas.
Esta ética cruel, no entanto, não tem nada a ver com esquerda ou direita, com capitalismo ou comunismo. A guerra tem uma ética (ou anti-ética) própria que prescinde de ideologias. Todo ato intencional de matar é um assassinato, não importa se se trata de legítima defesa, de um carrasco executando um condenado em nome do Estado, ou de um soldado matando um inimigo em nome da Liberdade e da Democracia. Quem vai à guerra é para matar. É a ética do crime, a ética da briga de rua. Recordo a descrição impecável de Ricardo Soares em seu romance Nadir (Campina Grande, 1975): “Pirajibe sempre imaginara que um dia haveria de enfrentar o João Cláudio. Seu último sucesso, numa briga, remontava aos quinze anos. Depois é que aprendeu, em teoria, que, ao enfrentar um homem, deveria colocar o medo de matar ou de ferir gravemente de lado. Brigar pra valer. Nada de avaliar conseqüências, pois isto, já sendo um medo, derrotá-lo-ia de saída. Foi o que procurou pensar quando enfrentou João Cláudio. Sabia que ele era ágil, feroz e criminoso. Fez-se criminoso, feroz e ágil.”
Será mesmo preciso igualar-se ao inimigo, para ter alguma chance de derrotá-lo? Será que só é possível chegar a Poder e manter o Poder fazendo o jogo sujo do Poder? Brecht dizia que para mudar o mundo a gente não devia recusar-se nem mesmo a se aliar ao carrasco. O problema é que tem cada vez mais gente se aliando aos carrascos, e o mundo não muda nem a pau.
Grande questão. Quando resolvermos essa questão, a humanidade irá dar um grande passo. Isso depende de seu esclarecimento. A medida que os homens perderem o medo de perder seus corpos, quando são ameaçados, ai não mais precisaram destruir outros corpos para sobreviver.
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