segunda-feira, 10 de março de 2008

0191) Cordel na sala de aula (31.10.2003)




Caros leitores, espero que não me censurem por fazer neste discreto espaço a publicidade de minhas atividades profissionais. Na próxima semana estarei em João Pessoa participando do Fenart, numa mesa-redonda sobre Cultura Popular na terça (dia 4), e realizando uma oficina sobre Cordel de quarta a sexta-feira (dias 5 a 7), sempre à tarde. A Oficina, parece-me, será aberta ao público em geral, mas se dirige principalmente a professores do nível fundamental e médio. Seu título é: “Cordel: como escrever, como ensinar”. Mais informações com a Funesc, no Espaço Cultural.

Ministrei esta oficina nos últimos anos em São Paulo, por iniciativa de Antonio Nóbrega, meu parceiro em canções e peças teatrais. A idéia de Nóbrega, com seu Teatro Brincante, é ministrar oficinas sobre cultura popular brasileira para professores que lidam com crianças e adolescentes em São Paulo. Como estes professores geralmente são paulistas, têm dificuldade em abordar o folclore, a arte nordestina em geral. Daí, o teatro faz oficinas diferentes a cada mês. Por exemplo: em março os alunos estudam Frevo, em abril estudam Artesanato em Barro, em maio estudam Bumba-meu-boi, em junho estudam Mamulengos, etc.

Num desses meses, estudam poesia popular nordestina: o Romanceiro e a Literatura de Cordel. Noções elementares de métrica e rima (que muitos poetas profissionais, acreditem, às vezes ignoram), história do romanceiro ibérico trazido pelos colonizadores, e noções práticas da arte da poesia. Alguém já saiu desta Oficina (ou de qualquer outra) diplomado como poeta? Duvido. O objetivo é transmitir as regras do cordel, as noções básicas de como escrevê-lo, e alguns truques postos em prática por quem joga esse jogo há vários anos.

Mais do que formar poetas, oficinas deste tipo (que hoje acontecem em muitos pontos do Brasil) querem ajudar o professor a transmitir para crianças e adolescentes o gosto descompromissado pela poesia, pela expressão verbal, pela brincadeira com rimas e com ritmos, pela possibilidade de se expressar através da “linguagem enriquecida” que é a poesia. Não estou muito a par do que as escolas de hoje ensinam sobre poesia. Quando eu tinha 12 anos tinha que decorar o que era écloga, ditirambo, arcadismo. Foi em casa que aprendi a contar sílabas, a escolher uma rima, aprendi a fazer quadrinhas e pés-quebrados, e aprendi que poesia não tem receita. Existe o verso livre, o metro livre; e existem formas fixas, com regras claras. O cordel é uma destas. Afora isto, temos todo o direito de escrever o que nos dá na telha. O cordel nordestino nasceu porque um bando de nordestinos humildes, sem títulos acadêmicos, muitas vezes autodidatas que jamais sentaram num banco de escola, sentiram-se no dever de aprender a fórmula, e no direito de escrever o que lhes dava na telha. Que esse dever e esse direito sejam restaurados para os meninos nordestinos de hoje, é o mínimo que podemos desejar.

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