domingo, 9 de março de 2008

0139) “Bertsolaris”: os repentistas bascos (31.8.2003)



Os “bertsolaris” são os repentistas do País Basco, aquele de quem a gente só ouve falar quando os guerrilheiros do ETA fazem um atentado a bomba. 

O ETA luta pela independência dessa nação que tem sua própria língua, sua tradição cultural e sua história, mas que foi cortada em duas, ficando 25% no sul da França e 75% no norte da Espanha. O idioma basco, ou “euskara”, é uma raridade linguística. É diferente de todos; ninguém sabe ainda sua origem. 

Os 2 milhões de bascos são extremamente afeiçoados a essa língua e à terra natal. Há séculos sonham em ter seu próprio Estado e governo, mas não está fácil. E tome carro-bomba.

Uma das tradições deste povo tão tradicionalista são os seus repentistas, chamados de “bertsolaris”. Minha ignorância do idioma basco dispensa comentários, mas como eles chamam suas estrofes de “bertso”, imagino que “bertsolari” signifique algo como “versejador”. 

Tal como nossos cantadores, os “bertsolaris” improvisam versos em estrofes de forma fixa, atendendo a pedidos da platéia, e fazendo desafios entre si (sem o acompanhamento de instrumentos). Ao que parece, o “bertso” não é improvisado espontaneamente, de acordo com a vontade do próprio poeta, como acontece com frequência entre os violeiros nordestinos. É preciso que alguém da platéia proponha um tema, uma provocação, e a partir dela os repentistas fazem suas estrofes.

Entre as estrofes típicas dos bertsolaris, o “zortziko mayor” é uma estrofe de 8 linhas onde as linhas pares têm a mesma rima. Seria, na notação adotada no Brasil, uma estrofe com rimas aBcBdBeB. Os versos ímpares têm 10 sílabas, e os pares têm 8. 

Já o “zortzyko menor” segue o mesmo esquema de rimas, mas seus versos têm respectivamente 7 e 6 sílabas. 

Também existem o “hamarreko mayor” e o “hamarreko menor”, que são as mesmas estrofes anteriores ampliadas para 10 linhas. 

Um hábito típico dos poetas é, ao ouvir o pedido da platéia, imaginar rapidamente uma resposta à altura, que será o desfecho, as duas linhas finais, e vir improvisando a estrofe desde o começo, até fechá-la com essas duas linhas de maior impacto. É o que no Nordeste os cantadores chamam “a queda do verso”, as últimas linhas improvisadas antes de se repetir o mote dado pela platéia. (O mote, como o usamos, não é usado entre os bascos).

Os bascos têm também o seu equivalente ao cordel, o que eles chamam de “bertso paperak”, ou “verso de papel”. São folhas soltas onde alguns improvisos famosos são reproduzidos e passados adiante; não parecem tanto com nossos folhetos, e sim com os nossos “poemas” impressos num só lado de uma folha de papel jornal. 

Os “paperak” surgiram no período das guerras carlistas (1839-1876); quanto ao “bertso” improvisado, sua história vem desde o ano 1800. Os “bertsolaris” de hoje se enfrentam em festivais que arrastam milhares de espectadores. Existem hoje cerca de 100 escolas de “bertso” no País Basco, com um total de 800 alunos. Dá até inveja!






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