("James Tiptree, Jr.")
Em suas entrevistas, Ursula K. Le Guin diz
envergonhar-se de um momento no início da carreira quando, para publicar em
revistas de FC quase exclusivamente masculinas, usou o nome “U. K. LeGuin” para
que os leitores pensassem que ela era um homem, e lessem seus contos. A FC
norte-americana foi sempre um domínio de nerds anglo-saxões; eu mesmo me
surpreendo até hoje com o fato de alguém como Isaac Asimov ter feito sucesso
sem precisar de pseudônimo.
Ursula não foi a única, coitada, a usar
esse joão-sem-braço das iniciais para esconder seu gênero. Lembro de C. L.
Moore (1911-1987), autora das aventuras espaciais de Northwest Smith, entre as
quais o clássico “Shambleau” (1933). Esposa e parceira de Henry Kuttner, Catherine
L. Moore disfarçou sua identidade feminina através de várias colaborações com o
marido e pseudônimos como “Lawrence O’Donnell” e “Lewis Padgett”.
Algo parecido se deu com a carreira de
Leigh Brackett (1915-1978), a formidável roteirista de filmes como “Rio Bravo”
(1958), “The Long Goodbye” (1973) e “O Império Contra-Ataca” (1980). O prenome
unissex certamente a ajudou em sua carreira literária. Rola uma história de que
Howard Hawks leu um livro dela e mandou contratá-la para trabalhar no roteiro
de “The Big Sleep” (1946, adaptando Raymond Chandler), pensando que se tratava
de um homem.
O caso mais notório é o de Alice Sheldon
(1915-1987), que usou o pseudônimo de “James Tiptree Jr.” para entrar no
mercado de FC e conseguiu manter esse segredo durante dez anos. Durante esse
período alguns críticos notaram um certo viés feminino na ideologia de seus
contos, que produziram um tremendo impacto entre os leitores, sendo ainda hoje
um exemplo de tratamento diferenciado das questões de gênero na FC. Em 1977 Gardner Dozois publicou uma extensa
análise de sua obra, ainda acreditando tratar-se de um homem. Talvez o disfarce
tenha sido necessário à autora por questões pessoais: ela foi agente da CIA
entre 1952-1955, e depois teve uma carreira acadêmica (era doutora em
Psicologia Experimental) que preferia manter à parte de sua atividade literária.
Exemplos como estes (certamente há
outros) são uma ilustração a mais das dificuldades que uma mulher encontra ao
disputar vaga num mercado onde os homens predominam, não somente como leitores,
mas também como editores, ou seja, as pessoas que decidem o que vai ser
publicado. Hoje, mais de 40 anos depois, nomes disfarçados dessa forma são
desnecessários, mas as recentes polêmicas envolvendo o Prêmio Hugo (onde se
debateu ferozmente a legitimidade de uma FC escrita por “minorias”) mostra que a
briga continua.
Bráulio, entendo que o motivo pode ter sido esconder uma identidade feminina que seria preterida. Mas a gente tem algo de homem, quase uma identidade também. Não sei como isso se chama.
ResponderExcluirDigo isso porque tive alucinações auditivas numa época, e o homem que falava comigo era homem mesmo, com atitudes de homem. E, apesar de acreditar que o desconhecido existe e está aí para ser descoberto, o que eu poderia acreditar ser esse homem das minhas alucinações senão eu mesma?
Talvez, em algumas dessas mulheres, essa identidade fosse mais forte na escrita.
Estou com vontade de lê-las, embora ainda ache PKD muito sexy rs