Foi em julho de 1862 o passeio a barco que o reverendo
Dodgson, identidade civil de Lewis Carroll, fez com duas garotas de quem era
amigo. Durante o passeio, contou a elas a primeira versão das aventuras de
“Alice no País das Maravilhas”. Esse livro e sua sequência “Alice Através do
Espelho” formam um díptico que não tinha muita semelhança com o que se
publicava em seu país naquele tempo. As disciplinas intelectuais e as fixações
pessoais de Carroll eram heterogêneas o bastante para garantir que nem todo mundo
iria entender tudo, mas todo mundo iria gostar demais de um aspecto do livro.
Carroll deve ter escrito suas obras pensando tanto nas
crianças ledoras e entusiasmadas quanto nos colegas lógicos e matemáticos, todo
o pessoal que gosta dessas disciplinas, principalmente a geometria e o estudo
do espaço e das dimensões. Quem gosta desse aspecto do “Alice” pode gostar da
FC de Rudy Rucker e das gravuras de M. C. Escher. Todos os que gostam de
labirintos tendo por base a geometria em sucessivos espaços dimensionais –
desde o ponto, a linha, o plano, a distorção temporal e da quinta dimensão em
diante. Sendo escritor de FC, “o seu é o limite”.
Ele misturava personagens e situações que não pareciam
pertencer ao mesmo universo: animais falantes, cartas de baralho, monstros
míticos, cavaleiro medieval, xadrez, realidade flexível... E algumas imagens
que mesmo talvez inspiradas em algo anterior passaram a ser indissoluvelmente
dele: o homem-ovo Humpty Dumpty sentado no muro (celebrado por John Lennon), os
dois gêmeos Tweedledum e Tweedledee (celebrados por Bob Dylan), o sorriso do
Gato de Cheshire (celebrado por Gal Costa). E talvez tenha ajudado Monteiro
Lobato a misturar Tom Mix com mitologia grega, o Gato Félix com o Saci.
Seu texto tem uma certa imprevisibilidade lógica, algo que
ele talvez tivesse em pessoa. Aquele indivíduo educado, contido, que gosta de
falar e daí a pouco está pensando em voz alta, fazendo raciocínios ou
suposições que deixam os interlocutores mais perdidos do que cego em tiroteio.
Uma espécie de professor amalucado, mas basicamente inofensivo e simpático. As
coisas que ele anotava em seus diários, “hoje inventei isso, hoje desenvolvi a
idéia tal”, são surpreendentes. Vivia num mundo mental só dele, era meio
esquisitão mas ao mesmo tempo todos o respeitavam.
Eu considero o lewis carroll como o maior escritor nonsense do mundo.
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