Existe filme de susto e filme de suspense. São sensações diferentes: a queda que machuca o joelho, e o mergulho numa montanha russa. Uma das nossas primeiras descobertas na linguagem do cinema é a diferença entre estas duas. Não são duas ideologias estéticas; são dois tipos de recursos que os diretores hábeis usam alternadamente, conforme lhes convém. Os dois não são antagônicos, a não ser no sentido de que não podem ser usados simultaneamente. Sabendo a hora de usar cada um, o diretor faz sua fama.
Alguns sustos de Hitchcock: uma cena no antigão A Dama Oculta (1938), em que pessoas buscando a dama desaparecida num vagão de carga de trem
fazem surgir de repente uma imagem em display (de papelão pintado), em tamanho
natural, de um mágico. Ou a irrupção
súbita das aves ameaçadoras, depois que a casa toda foi trancada, através da
chaminé (Os Pássaros). O susto é
aquele corte brusco, uma cena calma, que vai fluindo de maneira aparentemente
natural, e de repente... BAM! Uma coisa
acontece, e faz 500 pessoas darem um pulo ao mesmo tempo, na sala de projeção.
Hitchcock costumava dizer que o susto é quando a platéia, um
segundo antes, não sabe o que vai acontecer; e que o suspense é quando ela sabe
o que pode ocorrer (ou está a ponto de ocorrer) mas o personagem não. Duas pessoas conversam tranquilamente numa
mesa de restaurante sem saber que há uma bomba-relógio ligada, embaixo dela:
mas o público sabe, e é o fato de saber que gera o suspense. Note-se que não basta haver a mera
possibilidade de uma bomba, um tiro, um ataque: é preciso que o diretor mostre
com clareza que isso está, sim, para acontecer.
Todo diretor (ou roteirista) precisa saber explorar a
ignorância-do-espectador e a onisciência-do-espectador. Em certos casos, a gente obtém um efeito mais
forte sobre a platéia mantendo-a “no escuro”, desinformada, sem saber algo
crucial. No segundo caso, o efeito é
obtido ao contrário: dando ao espectador uma informação importante sobre a
trama ou sobre uma cena específica, informação que o personagem não tem. O espectador, na sua relativa onisciência (ele
“sabe tudo” a respeito daquele detalhe, o personagem não) entra numa atividade
mental mais intensa e mais prazerosa, comparando o que os personagens estão
fazendo e dizendo, na tela, com o que fariam ou diriam se soubesse o que ele,
espectador, já sabe.
Excelente, Braulio. Duas situações que nos causam uma deliciosa taquicardia: uma pela surpresa, outra pela angústia. ;)
ResponderExcluirOps, misqueci do link #2: A Variante Lünenburg = http://www.estantevirtual.com.br/b/paolo-maurensig/a-variante-luneburg/1432488157
ResponderExcluirBom proveito!