(ilustração: Debbie Millman)
Falo aqui de vez em quando sobre certos erros ou distrações que acabam nos dando idéias criativas. Interferências do Acaso, produzindo uma idéia que nunca teria nos ocorrido pelos canais costumeiros. São muitos os exemplos de coisas que interpretamos erradamente e que equivalem a um ato de criação. É claro que nem todo erro nos dá uma boa idéia, mas o importante é ficar atento ao processo. Muita coisa boa já surgiu dele, e o exemplo que cito sempre é “O Evangelho segundo Jesus Cristo” de José Saramago. O livro surgiu depois que ele leu erradamente, ao passar por uma banca de revistas, algumas palavras isoladas, que pareciam formar esse título. Não era; mas o título lhe pareceu interessante, e o livro todo surgiu daí.
Eu
estava assistindo um documentário e no fim apareceu um letreiro, todo em letras
caixa alta (maiúsculas), dando informações sobre as pessoas abordadas no
documentário. Dizia que elas estavam “produzindo
um ovo”, e que “o lucro com a venda do ovo” seria empregado nisso e naquilo...
Prestando mais atenção, percebi que a palavra não era OVO, era DVD. Um caso parecido foi o do cartaz de uma peça,
que li à distância; o título era FREUD (havia um retrato dele) mas eu li FREVO,
porque o traçado das letras era muito parecido. (Caberá uma analogia entre o
frevo como dança instintiva e o modo como o inconsciente se manifesta?)
No
interior do Nordeste vi uma placa na beira da estrada anunciando o HOTEL PAN
DRAMA, título que achei original até perceber que era apenas “PANORAMA”. Quem também não escapou da minha ficção
miópica foi o livro de Laurentino Gomes, “1808” que de longe imaginei ser
intitulado “ISOS” e fui olhar de perto para saber que diabo era aquilo. Mas não é só comigo: meu amigo Pedro Ribeiro
comentou um dos meus artigos sobre este tema, “O erro poético”, dizendo que no
primeiro relance imaginou ter lido “O perro erótico”, o que não deixa de ser um
tema pedindo para ser mais bem desenvolvido. (Alguma alusão inconsciente a “El
Perro Andaluz” de Luís Buñuel, será?)
Durante certa época eu pegava ônibus num local onde havia um vendedor de pipocas industrializadas, dessas que vêm dentro de saquinhos fechados. Ele gritava: PIPOCA COCHRANE! PIPOCA COCHRANE! pronunciando "Cochrane" como se houvesse um acento circunflexo sobre a letra A. Mesmo sem nunca ter visto a embalagem das pipocas eu achava que a marca era uma homenagem ao Lord Cochrane, e pensava: "O vendedor não sabe inglês e está errando a pronúncia, porque essa palavra é proparoxítona. Só muito tempo depois (da ordem de meses) é que vim a perceber que o homem estava apenas querendo dizer que a pipoca era CROCANTE! =D
ResponderExcluirOutro dia, assistindo a um documentário sobre o cinema paraibano, "tresli", ou melhor "des-tresli", sobre o título dado em homenagem à cidade cinematográfica Cabaceiras: ROLIÚDE NORDESTINA! Localizada no Cariri paraibano, Cabaceiras é uma das cidades com menor pluviosidade no sertão nordestino. A produção de cinema agradece pela luminosidade gratuita o ano inteiro! Não que seja exatamente um erro de leitura, mas ao ler Roliúde pensei mesmo que fosse!
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