sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

3706) Tudo que reluz é Louro (9.1.2015)



(Instituto Lourival Batista, na antiga residência de Louro)

Acabo de chegar do Vale do Pajeú, onde passei cinco dias que pareceram durar cinco minutos mas valeram por um curso de cinco meses. A festa do Centenário de Lourival Batista (1915-1992), o velho e querido Louro do Pajeú, juntou centenas de poetas, cantadores, glosadores, cordelistas, pesquisadores, apologistas e estudiosos da poesia para comemorar os cem anos de um dos cantadores de viola mais amados, pelo cara talentoso, paternal, boêmio e inteligentíssimo que era.

Foram cinco dias de festa, com shows de numerosos artistas e grupos locais, além de Ednardo, Xangai, Maciel Melo, Vital Farias. A família de Louro também subiu ao palco com sua filha Bia Marinho e seus netos Tonfil e os integrantes do grupo Em Canto e Poesia. Tivemos lançamentos de livros sobre poesia popular, shows de MPB e forró, mesa de glosas (a primeira que vi ao vivo, uma coisa fascinante), e apresentações de violeiros. Tive a alegria de reencontrar cantadores amigos meus há quatro décadas, como Severino Feitosa, Moacir Laurentino e João Furiba (lúcido e alegre com mais de 90 anos).

“Tudo que reluz é Louro”, o lema do evento, foi criado por Ésio Rafael e imediatamente adotado por Antonio Marinho, organizador-chefe, motor de mil cilindradas, que bate o escanteio e faz o gol de cabeça. Louro reluz na memória de todos, pelas muitas qualidades como pessoa e como poeta.  Rei do trocadilho na poesia popular, aplicou nela seu talento de charadista capaz de desmontar e remontar uma palavra em questão de segundos, sem esforço aparente.  Dono de uma língua ferina muito temida pelos adversários, era ao mesmo tempo incapaz de uma maldade.  Boêmio inveterado, passava três dias seguidos na farra, cantando, bebendo, despranaviando, e há quem diga que (como fez o sol com o bíblico Josué) a lua passava três dias e três noites sem se mexer no céu, para acompanhá-lo na farra.

Essa poesia é a poesia que brotou na Serra do Teixeira por volta de 1850 e meio século depois começou a se derramar pelo verde do vale do Pajeú, unindo Paraíba e Pernambuco num país acima das fronteiras, onde a palavra “poeta” é forma de tratamento, e onde, se um menino de pés descalços se aproxima da gente na rua, não é para pedir dinheiro, é para oferecer um verso. Durante o evento desta semana, no centro da cidade uma multidão três vezes maior assistia shows de Pablo, Harry Estigado e Calcinha Preta. São dois Brasis, duas cidades que enxergam mundos diferentes, convivendo no mesmo espaço urbano, na mesma rede de relações civis. A gente não precisa combater a cidade dos outros. Basta fazer com que a nossa continue assim: viva, alegre, forte e reluzindo, chamando a atenção dos satélites da NASA.




Um comentário:

  1. João de Almeida Martins14 de janeiro de 2015 às 15:03

    Bráulio, em Pombal já começaram os preparativos para comemoração dos 150 anos de Leandro Gomes de Barros. Estou sabendo que você será contatado para participar de eventos.

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