sábado, 12 de abril de 2014

3471) "Sérgio Samba Sampaio" (12.4.2014)


Para os muitos jovens ele é um nome desconhecido, porque suas músicas não tocam mais nas rádios FM nem na TV.  Estão na Internet?  Sim, estão, mas achar algo por acaso na Internet é o mesmo que achar uma agulha de vitrola num palheiro de irrelevâncias.  Para os mais ligados em música brasileira, ele é o autor da uma das marchas-rancho-pop mais cantadas dos anos 1970, “Eu Quero é Botar Meu Bloco na Rua”. Para quem prestou mais atenção na sua obra, principalmente no seu inquietante primeiro álbum (que teve esse mesmo título), Sérgio Sampaio (1947-1994) foi um desses cantores-compositores surgidos na época da ditadura, cheio de talento imprevisível, de uma simplicidade poética que o colocava meio próximo de Luiz Melodia e Odair José, de uma pegada roqueira que o levava para a praia de Raul Seixas (de quem foi parceiro no projeto “Sociedade da Grã-Ordem Kavernista”), de uma nunca apaziguada angústia existencial que o fazia ainda tão jovem ter algo do torvelinho dark e inescapável de Torquato Neto ou Nelson Cavaquinho.

Deve ser difícil encontrar os álbuns de Sampaio, mas sua audição pode ser complementada pela leitura de um precioso livrinho de análise do primeiro deles, de Paulo Henriques Britto: Eu Quero é Botar Meu Bloco na Rua (Ed. Língua Geral, 2009).  Mas o que muitos não sabem é que ele também era compositor de sambas saborosos e sincopados, pontuados por breques e refrões daqueles que grudam no ouvido.

Coube a um paraibano recuperar os sambas desse capixaba. Chico Salles, natural de Sousa e radicado no Rio há mais de 40 anos, é forrozeiro, sambista e cordelista de primeira água, e nas horas vagas de seu trabalho autoral fez o álbum Sérgio Samba Sampaio, produzido por Henrique Cazes e José Milton, com participações especiais de Zeca Pagodinho, Raimundo Fagner e Zeca Baleiro (este último, aliás, autor de outra compilação póstuma do poeta, Cruel, 2005). 

Nesse disco precioso encontrei tesouros que nem lembrava que sabia de cor, como “Cala a boca, Zé Bedeu” (“Mas que mulher danada / essa que eu arranjei / ela é uma jararaca / com ela eu me casei...”), composto pelo pai do artista. Tem o partido alto de “O que pintar pintou”, tem o criativo jogo de palavras de “Polícia, Bandido, Cachorro, Dentista”, o samba-canção de separação “Nem assim”...  Sérgio Sampaio era a cara dos anos 1970, meio Novos Baianos em sua mistura de rock e samba, mas sempre com um travo de angústia que era só seu, umas melodias com ziguezagues inesperados, um apreço pelas rimas toantes.  Sua obra inteira ainda merece um estudo mais profundo, proporcional à emoção que ele ainda desperta em quem o viu surgir e depois desaparecer.