terça-feira, 18 de março de 2014

3449) Bernard e Jean-Claude (18.3.2014)




Bernard Madoff é o cidadão responsável pela maior “pirâmide” financeira já desmascarada nos EUA, onde essa maneira de lesar os incautos se chama “Ponzi scheme”.  Madoff pegou bilhões de dólares de milhares de pessoas e de empresas, falou que estava aplicando e que iria pagar belos dividendos.  Quando alguém cobrava, ele tirava do “bolo” para pagar aquele cliente. O “pobrema” é que em casos assim o bolo vai ficando cada vez menor, e se uma certa quantidade de gente cobrar o seu ao mesmo tempo, a banca vai quebrar. A de Madoff quebrou em 2009. Ele fez desaparecer 65 bilhões em economias alheias, faliu milhares de clientes, e está cumprindo 150 anos de prisão sob o número 61727-054 numa cadeia na Carolina do Norte.

Madoff parece com um daqueles implacáveis “tycoons” em quem Philip Marlowe vive a tropeçar na Califórnia, mas muito mais parecido com ele é um personagem real, um francês chamado Jean-Claude Romand, que durante anos foi diante da família um médico que trabalhava na Organização Mundial de Saúde e todo dia deixava sua casa na França e cruzava a fronteira suíça. Romand vivia, na verdade, gastando as economias de seus amigos e parentes. A polícia descobriu que ele não era sequer médico, nem trabalhava em Genebra: ficava zanzando, passeando, lendo revistas médicas. As pessoas que lhe entregavam dinheiro começaram a querer o seu. Ele começou a ficar sem. E, no seu caso, desencadeou uma chacina familiar que ficou na história; há um livro e um filme, chamados O Adversário.  (Aqui, textos meus a respeito: http://tinyurl.com/mqahfyy, http://tinyurl.com/lfwqbzy)

Alguns bancos já faliram com meu dinheiro dentro, mas, felizmente, sempre deram um jeito de serem devorados por uma baleia confortável, e, quando precisei, meus caraminguás estavam intactos, felizes, abanando os andrajos na minha direção. Dois personagens: fico olhando o esquema faraônico de um e a tragédia shakespeariana do outro.  O fato de Romand ter podido ocultar seus trambiques da esposa, dos filhos, das autoridades, mostra que era um sujeito capaz de passar uma imagem de confiança, de serenidade. Ele não devia ser (a não ser na reta final da catástrofe) um sujeito que gaguejava, que caía em contradição. Madoff passou décadas enfrentando o mercado financeiro mais lupino do mundo, além da imprensa e dos advogados de Manhattan. Como durou tantos anos? A resposta: eram homens que infundiam confiança. Indivíduos acima de qualquer suspeita.

E na verdade tanto Bernard quanto Jean-Claude não são ninguém.  São apenas dois casos trágicos em que o Espírito do Nosso Tempo habitou um indivíduo inteiro de uma só vez, e o fez arder até o fim.


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