(escultura de Bernini)
A lágrima de mármore está fixa no ar, imóvel, solta. Eu passaria uma aliança em torno dela, se
tivesse. As serpentinas de mármore dos cabelos das dríades, retorcendo-se em
cachos revoltos, leves, quase flutuando. A abelha que mal roça a casca lisa do
fruto. A folha oscila ao lado de outras folhas e a posição de cada uma delas evoca
aquele ir e voltar.
O tempo parou, tudo que era carne virou Carrara, ou granito,
ou pedra sabão. Um instante atrás tudo
esvoaçava, tudo tremulava, tudo fluía, o mundo era um concerto de ondas
vibratórias, a carne, a folha, a nuvem, o cabelo, a sombra arrastada pelo
vento. Mas agora tudo está freezado no
espaçotempo: o pólen esvoaçante das flores, os respingos e os borrifos das
brincadeiras das náiades nas pedras ensolaradas do riacho. Cada microgota dessa
água que espadana é de pedra esculpida, tão fincada na paisagem quanto um
prego.
O tempo parou. Como uma alavanca puxada para trás, encaixada
numa ranhura, e presa ali. Pronto,
acabou-se, aquilo está lá naquele ponto e dali não vai sair jamais. No frontão guerreiro, o aço de mármore fende
os músculos de mármore, rompendo tudo no interior daquele corpo, cujo escudo de
defesa estava anormalmente erguido, claramente porque o artista entendia pouco
da luta que retratava aos bocejos. Seus guerreiros sonham vitórias de mármore
enquanto os outros gemem sua dor de mármore e morrem sua morte de mármore.
O caçador na orla da mata.
A corça no seu súbito salto, no seu susto, sua esquiva. Tudo em mármore. Aqui está o
arco ainda tremendo, a corda ainda vibrando, a flecha suspensa em algum ponto da
sua geodésica vacilante rumo ao alvo. Sobre esses olhos de mármore sem pupila,
chovem imagens de mármore que ele guardará para sempre em sua memória imune à
erosão. Poucas vezes a matéria parece tão indestrutível, tão protegida do
esfarelamento em grãos discretos, partículas soltas..
Clap, clap, clap! (Txt feito de luz, seu Braulio. Abração)
ResponderExcluir