(Carlos Fernando, no carnaval do Recife)
Meu
último encontro com Carlos Fernando foi em 2009, no Recife, no aniversário de
Aluísio Maluf, numa roda de violão que entrou pela madrugada, todo mundo tocando
sambas e forrós puxados do fundo do baú, e Alceu Valença regendo a roda num
coral cantando “Pressentimento” de Elton Medeiros: “Ai, ardido peito, quem irá
entender o teu segredo?...” Foi uma bela noite de farra, e Carlinhos, com sua
voz rouca e olhar encatitado, ficava entre uma música e outra, de dedo em
riste, verbalizando manifestos estéticos em favor de um determinado ritmo ou
esculhambando com a falta de memória do país, “ninguém conhece mais uma música
linda como essa!”.
Carlos
Fernando é o autor de “Banho de Cheiro”, gravado por Elba Ramalho (“Eu quero um
banho de cheiro, eu quero um banho de lua, eu quero navegar...”), um dos seus
sucessos que tocaram mais insistentemente nos últimos trinta anos. Compôs algumas
das canções mais lindas de Pernambuco, em parceria, principalmente, com Geraldo
Azevedo e Alceu. Mas foi, acima de tudo, um defensor do frevo, não somente o
frevo como música instrumental para se fazer o passo nas ruas e nos bailes
durante o Carnaval, mas o frevo como um dos gêneros atemporais, não-sazonais,
da Música Popular Brasileira.
Acho
que foi Capiba quem disse uma vez que o frevo poderia ser algo como o jazz, um
tipo de música vibrante, complexo, envolvente, que poderia ser composto, tocado
e dançado no mundo inteiro, independentemente de nacionalidade ou época. Carlos
Fernando não tinha uma formação musical complexa – na verdade, era mais
letrista, embora tivesse um senso melódico muito apurado. Seu frevo não era o
frevo instrumental das orquestras, era o frevo de canções com letra, no modelo
de Capiba e Nelson Ferreira. O seu projeto Asas da América (1979-1999) foi
uma das maiores iniciativas de um só artista em defesa de um gênero que já
houve na MPB. Compondo, produzindo, escolhendo cantores e arranjadores,
Carlinhos botou Chico Buarque, As Frenéticas, Alcione, Jackson do Pandeiro +
Gilberto Gil, Caetano Veloso, para cantar frevo. Gravou Tadeu Mathias,
Terezinha de Jesus, Lenine & Lula Queiroga (talvez a primeira gravação
conjunta dos dois), Flaviola e outros artistas nordestinos que surgiam na
época.