sábado, 14 de setembro de 2013

3291) "Riverão Sussuarana" (14.9.2013)




Viajando a Minas para participar do VI Festival Sagarana, tive um sobressalto quando a nossa van, num trecho estreito da estrada, sombreado de perto por folhagens, cruzou uma pontezinha e junto dela vi a placa discreta: 

Ribeirão Suçuarana. 

Não tinha como não lembrar imediatamente do único romance publicado por Glauber Rocha, que eu não sabia ter o seu título inspirado num lugar de verdade. 

Riverão Sussuarana saiu pela Record em 1978, e teve uma reedição em 2012 pela Editora da Universidade Federal de Santa Catarina. Foi mais um desses “romances experimentais” que explodem a linguagem narrativa, e eu o colocaria na mesma prateleira do Catatau de Paulo Leminski, Os morcegos estão comendo os mamãos maduros de Gramiro de Mattos, Me segura que eu vou dar um troço de Waly Salomão, etc. 

Livros fortemente marcados pela contracultura dos anos 1970, e por experiências com a linguagem que remetem tanto a James Joyce quanto aos autores “beat” norte-americanos (William Burroughs, Jack Kerouac, etc.).


Já o livro de Glauber remete a Guimarães Rosa; na verdade é uma extensa glosa aos temas do autor mineiro, que inclusive é personagem nos trechos iniciais. Glauber (narrando na primeira pessoa) e Rosa juntam-se à tropa que está tangendo uma boiada, e vão ao encontro de Riverão Sussuarana, cuja trajetória de vida ele descreve assim: 

“O pai do Riverão roubou o cavalo Joaquim dum cigano. Deu em fogo. Mataram o cigano e o pai de Riverão perdeu os ovos. Foi decapitado. Riverão criou-se pelo tio Ernesto Galvão que lhe cortou o dedo mindim. Lhe fez jurar vingança. Crescido Riverão foi discípulo de Peralva, um pistoleiro gaúcho. Entrou na Pensão Pedroza e matou os assassinos do pai. Preso, tocou fogo na cadeia e fugiu pra Bahya”.


O livro mistura pastiches bem feitos do Grande Sertão com as teorias conspiratórias e messiânicas de Glauber em seus últimos anos. Conforme era seu estilo na época, as letras K, W, Y e Z são usadas fartamente. Glauber escreve “Cachoeyraz”, “Tyradentes Kryszto”, “Komunysmo”, etc. 

Há trechos quase concretistas, outros que lembram roteiros de filme. 

Na página 214, surge do nada um parágrafo desconcertante: “A morte de minha irmã Anecy Rocha, no Marçabril carioca de 1977, arrebentou a estrutura de Riverão Sussuarana, e é o que acontece: várias páginas são dedicadas às discussões sobre a morte da atriz, que caiu no poço de um elevador. (Glauber inclui no livro dois contos escritos pela irmã.) 

Uma obra excêntrica, com lampejos da grande vigor literário aqui e ali, que precisa ser lida por quem se interessa por Glauber e por Guimarães Rosa.









3 comentários:

  1. tá na minha lista dos livros que eu devo ler.

    ResponderExcluir
  2. Puxa! uma lingugem que nos remete do bom e velho burroughs e joyce,e é esse que eu tenho que ler.

    ResponderExcluir
  3. A foto, aparentemente, é na redação do jornal Correio Braziliense

    ResponderExcluir