segunda-feira, 8 de julho de 2013

3230) Mostra a tua cara (5.7.2013)




A última vez que a Avenida Presidente Vargas e a igreja da Candelária ficaram daquele jeito foi no famoso comício das “Diretas Já”, que dizem que deu um milhão de pessoas. Não importa quantas foram. Nunca se vira tamanha quantidade. Mas no comício sobre a Emenda Dante de Oliveira havia um esforço concentrado e consciente vindo de cima, vindo das elites políticas, dos caciques partidários, dos notáveis com cacife para opinião política. Havia um sistema de som, um planejamento de mídia, e acima de tudo um palanque, onde oradores diriam mais ou menos o que se esperava que dissessem. Havia um centro.

Nada contra essa visão do mundo, só que é muito copernicana. O mundo não funciona de maneira tão simples. O fato de existirem criaturas e sistemas com aspecto de mandala não quer dizer que esse seja o estilo preferido da Natureza. Vai ver que às vezes ela se baseia em algoritmos químicos. Vai ver que às vezes se baseia numa eletromagnética binária do espaçotempo, e por cima dela um sistema retroalimentador e motoperpetuante chamado Vida.

A multidão não tem um centro pelo simples fato de que grande parte das coisas da Natureza não o tem. Suas características são outras. A multidão pode ser vista como uma câmara cheia de gás, lacrimogêneo ou não, onde é possível comprimir cada vez mais o gás e fazer suas moléculas, mais apertadas umas às outras, movimentaram-se num ricochete cego como o de bolas de pinball.

A multidão não é centro, é fatia estatítica de um Todo que é cada vez mais mapeado e investigado com fervor. Daí a importância de institutos de pesquisas e de coleta de dados porta-a-porta, algoritmos qualificadores, sistemas de amostragem mais sutis. Hoje a Presidente Vargas fica cheia e não se vê sistema de som, político ou palanque. Não existe Big Bang, não existe centro, não existe o Monarca de qualquer regime político. A multidão mostra que por baixo dessas Unidades aparentes o mundo é torvelinho perpétuo. Não tem rosto, tem coreografia e fluxo.

Cada avenida dessas, dura de gente (como se diz na Paraíba), é uma espécie de holograma onde está pelo menos um exemplo de cada elemento do Todo. Graças à rua estamos sabendo quem é isto ou aquilo, pelo menos no momento, já que as paixões políticas são tão intensas quanto passageiras. Olhando a multidão passar fica mais claro quem é contra ou  a favor de Dilma, quem repete slogan centenário, quem puxa hino, quem oferece caipirosca, quem mostra suástica, quem mostra foice e martelo, quem mostra cruz. Se o mundo fosse um lugar justo, coisa que nem sonha, cada um de nós poderia sair em praça pública e dizer quem é, sem medo e sem arrogância.



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