Certas discussões parecem aqueles intermináveis bate-bocas
de bêbado em mesa de bar em que, quinze minutos depois, todo mundo passa de
novo pelo mesmo assunto e ninguém se lembra de que tudo aquilo acabou de ser
falado. É o que acontece com o debate
entre literatura de gênero e literatura “mainstream”. Gênero a maioria das
pessoas entende o que é: é o romance policial, de terror, de faroeste, de
capa-e-espada, de ficção científica... Mas o que é literatura “mainstream”?
Me vem à mente aquele camelô de DVDs na Rua da Carioca, que
anunciava sua variedade de produtos: “Tem erótico, ação, suspense e
normal!...”. Ou então aquelas duas donas de casa no supermercado, à minha
frente, uma delas mexendo nos detergentes e dizendo à outra: “Tem esse aqui que
é limão, esse outro é maçã, e esse aqui é normal”. Percebi que por “normal” ela
queria dizer “neutro”, ou seja, aquele Limpol translúcido, sem um perfume
artificial específico.
Quando classificamos os gêneros, o que chamamos de
“mainstream” acaba sendo aquele tipo de literatura neutra, sem nenhuma
característica especial, sem nada de muito específico: isso é o normal. Não
haveria nenhum problema, talvez, se num mundo tão controlador como o nosso a
palavra “anormal” não tivesse uma conotação tão criminalizante, tão ameaçadora.
“Que tipo de literatura você faz?” “Faço literatura anormal”. A primeira coisa
que o entrevistador pensa é que você escreve sobre deformações psíquicas ou
sobre monstruosidades morais.
“Normal”, em nossa língua (ou pelo menos na língua da imprensa,
na qual vivo mergulhado) é uma coisa cujo gráfico é uma linha horizontal sem
grandes sobressaltos. Algo que não se afasta muito da medianidade, da
mediocridade. Sem nenhum atributo que chame a atenção. Uma média aritmética,
sem pontos muito altos e sem pontos muito baixos, sem defeitos que a
prejudiquem e sem qualidades que incomodem os demais. Ser normal, na
literatura, é ser incolor, inodoro e insípido como um copo dágua.
Eu ainda acho o surrealismo e o realismo mágico como grandes ferramentas. Que pena que, aqui no brasil não pegou de vez. Então, o quanto deve ser dificil para um escritor que tenha uma pegada surrealista ser publicado.
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