sábado, 13 de abril de 2013

3159) "Privilégio" (13.4.2013)





Na filmografia sobre rock, este filme de Peter Watkins (Privilege, 1967) é um título obscuro, um desses filmes que eu às vezes imagino ser a única pessoa que assistiu. Consegui agora uma cópia; e lamento que ele não seja mais conhecido, porque é um momento importante numa linhagem de filmes que exploram o potencial fascista, controlador, orwelliano do rock-and-roll. Em meu livro O Rasgão no Real (Ed. Marca de Fantasia, João Pessoa, 2005) coloquei-o numa lista que incluía Tommy de Ken Russell (1975), Pink Floyd – The Wall de Alan Parker (1982) e This is Spinal Tap de Rob Reiner (1984). Filmes que fazem com o rock o que os livros de Richard Dawkins fazem com a religião. Precisa ter muita fé pra continuar gostando.

Watkins ficou famoso com seu filme The War Game (1965), chamado de “docudrama” pelo seu estilo semijornalístico de contar uma história. “Privilégio” também utiliza esse artifício, mostrando-se como uma reportagem de TV sobre o roqueiro Steven Shorter, entrevistando seus empresários, assessores, etc., e cobrindo jornalisticamente tanto os seus shows quanto as reuniões do seu “staff”, coquetéis, entrevistas coletivas, etc.

Shorter, interpretado pelo cantor Paul Jones, tem, curiosamente, aquele misto de fragilidade, obstinação e angústia que transparecia muitas vezes em Ayrton Senna, com quem se parece fisicamente. Existe algo de caricatural na expressão continuamente sofrida do ator, mas a verdade é que ela corresponde de perto a sua “persona” no palco (que envolve encenações masoquistas, com ele sendo preso, algemado, espancado pela polícia, etc.).

Há uma cena hilária em que ele aparece num comercial de TV (na verdade uma propaganda do Ministério da Agricultura) incentivando a população a comer maçãs. É um troço extremamente kitsch, mas não muito diferente de várias coisas que os Beatles estavam sendo obrigados a gravar na mesma época. O melhor do filme são as sequências em que Shorter se torna garoto propaganda da Igreja, numa campanha conjunta com o Governo, para induzir os jovens ao conformismo político, com cenas que (li em alguma parte) são minuciosamente copiadas de O Triunfo da Vontade de Leni Riefenstahl. Alguns críticos viram nele uma premonição da Inglaterra de Margaret Thatcher.

Há poucos filmes críticos sobre o show business roqueiro. Este é um dos melhores, mesmo com um ritmo narrativo meio lento e interpretações nem sempre firmes dos atores. Ele mostra, no auge do rock britânico, as manipulações de bastidores, o comportamento cego-em-tiroteio do popstar, e a terrível elite de múmias-de-rapina que veste batina ou terno e fatura em cima da histeria das mocinhas adolescentes.



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