Todos
nós conhecemos o tipo.
Pode ser o sujeito farrista e raparigueiro que um belo
dia descobre a Bíblia e o culto de domingo à noite.
Pode ser o rapaz de boa família burguesa que
a certa altura descobre os livros de Marx e Che Guevara e fica rodando pela
cidade atrás de companheiros para fundar uma célula subversiva e tomar lições de
tiro ao alvo.
Pode ser o pai de família discreto e moralista que na meia-idade
começa a sair com uns rapazes exuberantes e em breve separa da mulher, vai
morar com um deles, e passa a soltar a franga como quem quer tirar décadas de
atraso.
Pode ser o oposicionista implacável que sempre castigou com seu látego
verbal todos os sucessivos governos mas de repente deixa-se cooptar por um
deles e agora vive bordando elogios e mensagens de otimismo à mera menção do
nome do caudilho da vez.
Pode ser o
beberrão incontinente que depois de anos de vexame descobre uma terapia
qualquer, cura-se e passa ser o arauto da temperança e da sobriedade, pra quem
até um carro a álcool é um passaporte para o inferno.
Os
exemplos são tantos que acabam convergindo todos para uma coisa só. O
Convertido é simplesmente um radical que só sabe ser radical; sente tal volúpia
na própria radicalidade que pouco importa em nome de quem ou do quê ela esteja
sendo praticada. Depois que esgota um lado do problema, ele arregaça as mangas
e começa a se dedicar ao outro.
A
questão mais interessante é, para mim, a facilidade com que o cara se converte,
a absoluta sinceridade com que o faz, e a felicidade esfuziante que experimenta
com essa mudança.
Na verdade, o Convertido é um sujeito que nunca havia se dado
o trabalho de prestar atenção no lado oposto. Fez sua primeira escolha muito
cedo na vida, ou talvez seja melhor dizer que a escolha foi feita por ele, e
ele a aceitou, porque, como todo jovem, estava pensando noutra coisa. O tempo o
fez roer essa outra coisa até os ossos. Instalou-se um vazio nele, e em volta
dele.
Aliás, era um tal cair de fichas uma atrás da outra que o sujeito acabou se
convertendo justamente àquelas idéias que se esforçara para ignorar, com as
quais nunca debatera, aquelas idéias que nunca examinara, aquelas idéias para
as quais ele sempre fechara os olhos e os ouvidos – vai ver porque sabia que
era daquilo mesmo que estava precisando.
Velhas freiras, jovens prostitutas. E vice-versa.
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