(Max Bertolini)
Na manhã seguinte, Zoroeu acordou cedo, tomou um pouco de
leite coalhado e desceu a ladeira. A
tempestade deixara a terra empapada, as barrancas derruídas, as pinguelas
difíceis de transpor, mas as poucas horas de sol tinham bastado para tornar
transitável o caminho. Ele rodeou o
mercado, já repleto àquela hora, contornou a pequena muralha que protegia o
acesso ao monte. Nas ruínas de uma
guarita homens narravam coisas em altas vozes.
Ao escalar o monte ele cruzou com
dois soldados romanos que desciam, fatigados, queixando-se de terem dormido
mal. Chegando no alto, viu que os corpos haviam sido levados, e que poderia
começar a remoção. À promessa de algumas moedas, dois homens corpulentos o
ajudaram a extrair do chão as cruzes e, depois de alguma negociação,
concordaram em arrastá-las até a sua tenda. Desceram o monte, refazendo o
trajeto, e ao chegarem as depositaram sobre o chão. Zoroeu lhes ofereceu água e
vinho, que eles aceitaram e beberam limpando o suor. Um deles fez um resumo
desinteressado das execuções da véspera, e depois de receberem o pagamento os
dois foram embora.
Zoroeu examinou primeiro as cruzes menores, ambas em bom
estado. Limpou as manchas de sangue seco, extraiu pedaços de cravos ainda
enfiados na madeira (às vezes, para os que desprendiam os cadáveres, era mais
simples dilacerar a mão do que extrair o cravo). Desencaixou as peças, após
cortar as cordas que ajudavam a fixá-las no cruzamento. A madeira era desgastada, velha, mas boa; somente
o braço horizontal de uma delas estava corroído por cupins e quase podre. Ele arrastou as quatro traves para os fundos
e as alinhou a outras que estavam ali desde a semana anterior. Só então voltou
e se concentrou na cruz principal, a que tinha chamado sua atenção na véspera.
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