quarta-feira, 3 de outubro de 2012

2992) "Margin Call" (3.10.2012)





A atual crise financeira, depois da catástrofe de 2008, foi provisoriamente neutralizada, mas com efeitos colaterais gravíssimos, como se pode ver na quebradeira geral de países como Grécia, Portugal, Espanha e outros. Para que os Bancos (envolvidos em absurdas negociatas) não fossem todos à falência de uma vez só, o que de certo modo acabaria com a civilização como a conhecemos, os governos injetaram ali trilhões de dólares e de euros que precisam vir de algum lugar. De onde vêm? Dos programas sociais e previdenciários dos países. Ou seja: para curar a doença vai ser preciso matar o paciente.

Revi The Corporation (2003, de Mark Achbar e Jenniffer Abbott, http://bit.ly/id3zO1), um documentário que prova, a seu modo, que as grandes corporações são semelhantes aos psicopatas criminosos: pensam apenas no próprio benefício, ignoram acordos, não dão importância ao sofrimento alheio, etc. Vi e comentei aqui Trabalho Interno (2010, de Charles Ferguson, http://bit.ly/arg7hS), analisando a crise de 2008: em consequência da desregulamentação da especulação financeira, as empresas produziram lucros fantásticos para si e para seus executivos, mesmo sabendo que aquele dinheiro inexistente teria que ser coberto mais cedo ou mais tarde – pela população, é claro.

Agora, vi este longa de estréia de J. C. Chandor, em 2011 (http://bit.ly/SVR2ge). A história se passa ao longo de dois dias de crise numa grande financeira que parece ter sido inspirada na Lehman Brothers, uma das vítimas de 2008. Um funcionário alerta seus chefes que a firma está prestes a falir pelo acúmulo de “papéis sem valor”. Segue-se uma tensa rodada de reuniões e negociações internas que se estende madrugada afora, e na qual rolam várias cabeças na estrutura de comando. A firma opta pela solução mais catastrófica, mas a única que pode salvá-la: vender todos os papéis, de uma vez só, no dia seguinte – e recuperar parte do dinheiro, antes que o mercado perceba o que está sendo feito. Com isto, é claro, a firma escapa, mas arruína seus clientes e provoca o “estouro da boiada” no mercado. O que aconteceu.

O elenco tem a presença de Kevin Spacey, Stanley Tucci, Demi Moore; e de Jeremy Irons, que, desdenhoso e cruel no papel do CEO da empresa, está assustadoramente parecido com o nosso banqueiro Daniel Dantas. É uma narrativa tensa, trancada o tempo quase todo nos escritórios de um arranha-céu, com imensas vidraças mostrando a indefesa New York em volta. Filmes como este estão fazendo um papel semelhante ao dos filmes políticos italianos da década de 1970: dramatizando hoje as manchetes dos jornais de ontem, revelando os fatos e refletindo sobre eles. 

Um comentário:

  1. Bráulio, pegando carona nessa sua consideração final sobre a ligação entre o presente e estes filmes, você não acha que as novelas não tem tentado fazer algo parecido ultimamente? Não digo refletir sobre o presente porque seria forçar a barra, mas retratar (com todas aquelas limitações: roteiro feijão com arroz, mocinha e mocinho apaixonados, blá blá blá...)um pouco do que está acontecendo. Principalmente essa ascensão de um novo grupo social, a tal da "classe C". Claro que tem um dedinho de interesse no IBOPE aí, mas será que isso é o indício que de as telenovelas hoje abriram novamente (ainda que com um pouco de remela, mas vá lá) para nossa realidade?

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