domingo, 16 de setembro de 2012

2978) Tempestade de Dylan (16.9.2012)




O novo disco de Bob Dylan, Tempest está chegando às lojas (ou melhor, já pode ser ripado livremente). O Bardo aproveitou a ocasião para dar mais uma entrevista à revista Rolling Stone, na qual solta o verbo sobre os críticos com uma irritação que há um bom tempo não demonstrava (“all those motherfuckers can rot in hell”). Bem, como é tempo de política, ele deve estar se dirigindo aos críticos republicanos.

Já escutei uma faixa no YouTube, “Duquesne Whistle”, que mais uma vez não é rock, começa como uma daquelas cantigas “honey pie” dos anos 1930, com uma bateriazinha básica, guitarra slide, órgão de apoio... Tem um clima de botecos clandestinos da Lei Seca, ainda com um glitter e um charme dos anos 1920, mas já com um cheiro de fumaça, poeira e pólvora da Depressão dos 30. Não é rock, como aliás não têm sido os últimos álbuns de Dylan. É uma raiz melódica do rock, uma raiz mais remota que o blues, ainda que menos poderosa. Curiosamente, uma raiz que Dylan compartilha com os Beatles, cuja música entre 1967 e 1969 bebeu nessa fonte “antiquada”, graças principalmente a Paul McCartney, cujo pai tinha sido músico de banda nesse período.

Dylan retoma na entrevista a discussão sobre os versos que andou “pedindo emprestado” a outros autores em letras de canções recentes. Os casos mais notórios são o livro Confessions of a Yakuza de Junichi Saga e os poemas de Henry Timrod (1828-1867), dos quais Dylan teria usado frases inteiras. Diz ele:

“No folk e no jazz a citação é uma tradição rica e enriquecedora. Alguém aí já ouviu falar em Henry Timrod? Quem de vocês leu os livros dele ultimamente? E quem foi que o trouxe à evidência agora? Quem fez vocês se interessarem por ele? Perguntem aos descendentes dele o que acham dessa discussão. E se vocês pensam que é fácil citá-lo, e que isso pode lhes ser útil, vão em frente e vejam o que conseguem. Estou trabalhando dentro da minha arte, dentro das regras e das limitações dela. Existe aí gente autorizada que pode explicar isso melhor do que eu. Chama-se ‘escrever canções’. Tem a ver com melodia e ritmo, e depois disso vale tudo. Tudo que você usa fica sendo seu. Todos nós fazemos isso”.

E antes que qualquer zé-mané se meta a copiar versos alheios, faço eu minha advertência final: você só tem direito de copiar 10% do que usa, e seus 90% têm que ser melhores do que o material alheio que você vier a usar. É justamente o caso de Dylan. Ele usa o alheio, mas num contexto tal que o alheio fica valorizado e enriquecido pelo novo contexto. No caso de Junichi Saga, pelo menos, ele afirmou sentir-se honrado por ter frases suas citadas por Dylan.


Um comentário:

  1. Oi, Braulio! Você falou em "Honey pie" e lembrei na hora da canção do Paul McCartney, de mesmo nome, do "Àlbum branco". Aliás, um casamento perfeito da musicalidade do Paul com a alma roqueira/bluseira do Lennon, não acha?

    http://www.youtube.com/watch?v=xS7wxh_atFY

    De qualquer forma, continuo achando o Album branco uma das "fases" mais interessantes dos Beatles. Tem até um lado mais Bob Dylan do Paul, em Rock Racoon, nessa linha do folk-menestrel... Enfim, me empolguei com seu texto e todas essas músicas me vieram à cabeça.

    Abraço!

    Edgard

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