A maturidade de um novo meio de
expressão (p. ex., o cinema, os quadrinhos, a TV, o videogame) não é atingida
quando produz obras que atingem milhões de pessoas, ou quando ganha prêmios
internacionais, ou quando é analisada e louvada nas torres-de-marfim
acadêmicas. Penso às vezes que essa
maturidade é atingida quando esse meio de expressão começa a abrigar cada vez
mais artistas fora-de-esquadro, artistas idiossincráticos cujas obras não dá
para entender muito bem, mas são obras que inquietam, desconfortam. Não trazem
mensagens, palavras de ordem ideológicas ou fórmulas mágicas de
auto-ajuda. São obras excêntricas,
personalistas, às vezes herméticas, às vezes chocantes – mas aquele meio de
expressão está tão maduro e consolidado como arte e como mercado que essas
obras são aceitas e incorporadas ao cardápio ofertado ao público, como a coisa
mais natural do mundo.
A maturidade do cinema teria sido
alcançada, por exemplo, com os primeiros filmes surrealistas de Luís Buñuel
entre 1928 e 1930, e se mantém hoje com a obra anticonvencional e difícil de um
David Lynch ou um Raul Ruiz. Nos
quadrinhos, um sinal atual dessa maturidade é a possibilidade de ver as novelas
gráficas de um cara como Charles Burns, autor de Black Hole e agora de Toxic (título da edição
francesa). Existe muito de David Lynch nas histórias desse desenhista nascido
em 1955: a atmosfera constante de pesadelo, uma sensação philipkdickiana de que
aquilo que estamos vivendo não está acontecendo de verdade e vai ceder lugar, a
qualquer instante, a algo um pouco mais verossímil mas igualmente
delirante. Seus personagens mudam de
rosto e de traço ao longo da história, deparam-se com objetos insólitos que não
reconhecem (mas que o leitor reconhece de um trecho anterior), são assaltados o
tempo inteiro por flash-backs inexplicáveis de coisas terríveis que lhes
aconteceram, ou com as quais eles simplesmente sonharam.
ResponderExcluirÉ o que sinto quando leio "Love and Rockets" dos irmãos Jaime e Gilbert Hernandez (http://en.wikipedia.org/wiki/Love_and_Rockets_%28comics%29) ou (http://www.blogdacompanhia.com.br/2011/10/maggie-e-ray/).
O traço remete a Archie, Betty e Veronica (http://en.wikipedia.org/wiki/Archie%27s_Girls_Betty_and_Veronica).
Mas as histórias... Bem as histórias são profundamente "realistas", muito embora apareçam esporadicamente demônios, realismo mágico, espaçonaves, dinossauros, invasão de macacos.
Dentre as influências admitidas pelos irmãos, temos Pixote, Zé do Caixão, o filme Orfeu Negro, luta livre mexicana, Peanuts, punk de L.A, Buñuel, Garcia Marques, etc e etc.
Por outro lado, sei que não é um "quadrinho" pra todo mundo.
Parte da graça é justamente acompanhar aos poucos, como uma novela, e ir descobrindo os motivos por trás do comportamento de tal personagem. Uma espécie de Lost em conta-gotas.
Inicialmente os roteiros de Gilbert eram mais interessante que Jaime. Depois Jaime passou adiante (aliás, MUITO a frente). É curioso acompanhar personagens desde sua adolescência, tornando-se adultos maduros.
É bastante curioso - por exemplo - ver uma garota punk revoltada com o mundo crescer para trabalhar numa escola cuidando de crianças.
É o tipo de desenvolvimento que acontece muitas vezes na vida, mas poucas na ficção...
Esses aí eu nãoconheço, voudar uma espiada depois. Mas vc tem razão, algumas formas de arte nos levam a acompanhar a vida dos personagens, numa escala que mesmo a telenovela (que dura de 6 a 10 meses) não proporciona. No cinema é ainda mais raro. Mas tem,p.ex., as variadas encarnações do Batman, 007, outros heróis.
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