Um bom exemplo de
como a Humanidade acaba realizando, por vias transversas, seus sonhos mais
profundos, é a história de Archibald DeVane, um industrial de família
tradicional de Minneapolis, que, como muitos dos seus contemporâneos,
acreditava na Teoria da Terra Oca.
Filho de um casal de
rígida moral puritana, DeVane acreditava com fervor naquela controvertida
hipótese científica.
As fotos da época
mostram um indivíduo alto, bem apessoado, de espessa barba negra, vestido com
sobriedade e bom gosto. Nunca aparece sorrindo, e sempre encara a câmera com
olhos intensos. O remo e a equitação eram suas atividades de lazer preferidas. Entre
suas leituras, além das obras científicas relacionadas a seu interesse
principal, apreciava as obras sobre mitologia.
DeVane trabalhava com
disciplina monástica. Montou e desenvolveu uma indústria de enlatados. Todo seu
esforço tinha como objetivo financiar uma expedição científica capaz de
comprovar a veracidade da teoria da Terra Oca e tornar-se assim um benfeitor da
humanidade. (DeVane viveu numa época, o século 19, em que tornar-se um
benfeitor da humanidade era um objetivo mais inteligível do que “ficar
famoso”.)
Havia duas maneiras,
nos anos 1890, de tentar comprovar essa Teoria.
A primeira era fazer
uma expedição marítima ao Polo Norte, onde se acreditava existir um enorme
abismo que sugava para dentro de si a água dos oceanos, transferindo-a para o
interior da Terra, onde elas banhavam os continentes subterrâneos. (A teoria explica
que essa água retorna à nossa superfície graças a milhões de fontes
subterrâneas, ou a aberturas no fundo dos nossos oceanos.)
DeVane optou pela
segunda solução: a escavação de um túnel que a certa altura romperia a crosta
interna do planeta, permitindo ao grupo de aventureiros emergir nessa nova
superfície que se situa pelo avesso da nossa.
Depois de uma ampla
pesquisa assessorada por geólogos de renome, foi escolhida uma região na
Carolina do Norte, e tiveram início as escavações. Ali seria descoberto um Novo
Mundo, onde existia (segundo versões conflitantes) o Eldorado, ou uma Utopia
naturalista e espiritualizada, ou uma floresta sem fim com fauna e flora
deslumbrantes, ou o refúgio final da Tribo Perdida de Israel.
Todo sonho é pouco para
um sonhador capaz de financiar a si próprio. Quando as escavações já iam com
cem metros de profundidade, DeVane viajou a Londres para fechar uma parceria
com a Landmark & Co., empresa de engenharia e construções que lhe fora
recomendada pelo embaixador norte-americano na Grã-Bretanha.
Em sua primeira
reunião, conseguiu a adesão da presidente, Mrs. Willoughby, uma viúva
riquíssima cujo objetivo na vida era dar um bom uso para o dinheiro deixado
pelo falecido esposo, um plutocrata octogenário.
Logo nas primeiras
reuniões, e nos primeiros jantares, os dois descobriram terem gostos em comum:
a pintura de Bouguereau e de Alma-Tadema, as óperas de Puccini, a astronomia
amadora.
Entusiasmada pelo
entusiasmo de DeVane, ela propôs que os dois fossem a São Petersburgo contratar
uma empresa russa de engenharia que trabalhara na construção do Canal de Suez.
Ali, os dois
visitaram o Museu Armitage, os melhores restaurantes, e conviveram com a fina
flor da aristocracia russa. Depois, em Paris, visitaram o Louvre, dialogaram
com Lesseps; passaram um carnaval em Veneza; veranearam durante meses em Ibiza;
dançaram valsa em Viena; e certa tarde, quando repousavam numa suíte em
Casablanca, chegou um telegrama urgente. DeVane rasgou o invólucro e murmurou,
enquanto lia:
-- Canteiros parados? Milhões em prejuízo? Terra Oca? Mas, de que
demônios esse imbecil desse advogado está falando?!...
se encantou pela mulher e esqueceu do buraco hahahahaha
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