domingo, 11 de março de 2012

2815) Os Vendilhões do Tempo (11.3.2012)





Será sempre assim em todos os lugares, em todas as eras? As mais nobres aspirações da Filosofia e da Ciência deverão sempre acabar se curvando diante da cupidez humana, da cobiça burra? Será que a única utilidade de nossas funções mentais mais elevadas é a satisfação de instintos rudimentares, sem a qual não sobrevivemos, ou, pior, sem a qual não somos felizes? 

Cruzo a Praça da Bandeira sem nada para fazer neste interminável domingo de sol. Desempregado, divorciado, sozinho, esnobado pelos falsos amigos, vivendo de dinheiro emprestado pela dona da pensão.

Na praça as cabines se enfileiram, e junto de cada uma um malandro de boné. Vou me aproximando e ouço o pregão. 

-- Um dia no Dilúvio, segurança total, local com abrigo!

Vou passando. 

-- Assassinato de Kennedy, chefia! Gramado, armazém ou coreto! Binóculo grátis!. 

Penso nos quatro Prêmios Nobel sucessivos para as equipes de Weinsberg, Nakamura, De Sotto; na revolução que poderíamos ter realizado nas interpretações da História, num entendimento mais profundo das dinâmicas sociais, no contato tete-a-tete com homens e mulheres de um estofo moral e intelectual superior ao nosso. 

Ao invés disso, o que criamos? Esse varejo insuportável de vans temporais, de táxis-bandalhas que não fazem outra coisa senão costurar o “continuum” com o ir e vir de analfabetos funcionais que pensam estar se tornando mais alguém pelo simples fato de poderem passar algumas horas na corte de Luís XIV (sem entender uma palavra do que se conversa lá, diga-se de passagem, e sem suportar a fedentina) ou de ver Carlos Gardel cantando ao vivo numa biboca de esquina, só para voltarem a Campina Grande e dizerem que ele “está cantando cada vez melhor”.  

Foi para isto que demos um nó-moebius nas leis da natureza? Que sacrificamos a evolução natural do mundo civilizado, ficando assim como estamos hoje, congelados num eterno presente, marcando passo, deixando de ganhar centímetros de futuro simplesmente porque temos disponíveis milhões de léguas de um passado ininteligível para visitar?

Chego na ala do comércio estatal. O gordinho de camiseta anuncia: 

-- Batalha dos Guararapes! Programa educacional! Traga a família inteira, inclusive a sogra, nunca se sabe o que pode acontecer! 

Pra que serve meu PhD em Fractalismo Quântico? O mundo virou um camelódromo de turnês instantâneas, turismo dos sem-noção. Suspiro, paro na última cabine, uma mulher magra berra no megafone: 

-- Duas horas no Baile da Ilha Fiscal! -- Pergunto quanto, ela diz: -- Dois trilhões e meio de brasilreais, tá na promoção! 

Conto minhas moedas, estendo para ela: 

-- Se eu não quiser voltar, não insista.










Um comentário:

  1. Excelente do Blog, com grandes idéias, já está nos nossos favoritos Braulio.

    Gosto de poesia e prosa e de ver o que meus amigos de rede escrevem. Parabéns pela publicação. Isso só enriquece nossa cultura e literatura.

    Deixo aqui o site www.paipoeta.com.br se quiserem debater sobre poesia e sobre a própria literatura.

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    Muito bom!

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