Artigos de Braulio Tavares em sua coluna diária no "Jornal da Paraíba" (Campina Grande-PB), desde o 0001 (23 de março de 2003) até o 4098 (10 de abril de 2016). Do 4099 em diante, os textos estão sendo publicados apenas neste blog, devido ao fim da publicação do jornal impresso.
quarta-feira, 17 de agosto de 2011
2637) A história de Zé Francisco (17.8.2011)
Eu devia era checar com os descendentes de Zé Francisco os detalhes desta história, que para mim já se despregou da mera biografia e ascendeu ao reino das lendas. Vai ela aqui, e quem conheceu o “santo” que reconheça (ou não) o “milagre”.
Zé Francisco morava em Alagoas, nos anos 1940, e quando começou a Grande Guerra houve um alvoroço total. O mundo pegava fogo; havia até mesmo europeus ou brasileiros filhos de europeus que embarcavam de volta para a Europa, para defender seus respectivos países.
O Brasil, pelas manobras de Vargas, demorava a entrar no conflito. Acabou entrando; e Zé Francisco saiu de sua cidadezinha de Alagoas para vestir a farda e lutar no “front”.
Fusão para poucos anos depois. Campo de batalha numa floresta italiana. Uma tropa alemã está sitiada numa casa, no meio de um vale, e os brasileiros a cobrem de rajadas de metralhadora. Zé Francisco é um deles. Depois de um fogo mais cerrado, eles começam a perceber que a maioria dos alemães morreu, mas no andar de cima há pelo menos um sobrevivente, bem municiado, que continua a defender o posto. Zé Francisco pede aos amigos que o cubram, disparando contra as janelas de cima, enquanto ele sai das árvores e corre até a casa, para entrar pela porta e dar cabo do alemão.
Botam o plano em prática. A fuzilaria é intensa enquanto Zé Francisco corre, protegendo-se, até a porta da frente.
O tiroteio para. Ele empurra a porta e entra. Vê corpos de alemães caídos por todo lado; e uma escada que sobe até um alçapão que dá acesso ao andar de cima. Zé Francisco se encaminha para ela, pé ante pé, vai subindo.
Chegando lá no alto ele ergue o fuzil e, com a ponta da baioneta, começa a levantar a tampa do alçapão. Quando a levanta por completo, o que vê? Vê a boca enorme de uma metralhadora apontando para seu rosto, e, por trás dela, o rosto do alemão que empunha a metralhadora, pronto para disparar. E quando os seus olhos se cruzam, o alemão exclama, assustado: “Zé Francisco! O que é que você tá fazendo aqui, homem de Deus?!!!”.
Sei que a história não é exatamente assim, velhos, mas este é o segredo da literatura: usar a imaginação quando a memória nos falta, e usar a memória quando nos convém. Todos os grandes episódios da História são contados dessa maneira, desde a Grécia clássica e a Roma Antiga até a Revolução Francesa e o Descobrimento do Brasil.
O alemão entrincheirado naquela casa morava em Alagoas e era um dos que tinham voltado à Pátria para vestir sua farda e defender seus ideais. Pelo que me lembro (daquela frase em diante a história perde nitidez e interesse, pela parte que me toca), o alemão foi preso e Zé Francisco foi avalista de sua sobrevivência durante as semanas seguintes, de modo que tudo acabou bem para todos os envolvidos.
Mas a mera possibilidade de um encontro como esse nos faz exclamar como Riobaldo Tatarana: “Ah, esta vida, às não-vezes, é terrível bonita, horrorosamente, esta vida é grande.”
confesso que fiquei sem saber se acredito ou não. acredito ou não?
ResponderExcluiracredite, se quiser.
ResponderExcluirLegal...me lembrou uma HQ que li há muito tempo, acho que de autoria de Moebius, em que dois inimigos figadais se encontram num planeta na periferia da galáxia...um era o chefe de uma expedição perdida...o outro era o chefe da expedição que ia resgatar a expedição perdida...mal se encontram, partem pra briga...
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